/12 PEDACINHOS DA GRÉCIA ANTIGA – 008 – Heitor, um verdadeiro herói

12 PEDACINHOS DA GRÉCIA ANTIGA – 008 – Heitor, um verdadeiro herói

HEITOR, UM VERDADEIRO HERÓI

Uma das histórias mais bonitas da Guerra de Tróia é a história de Heitor, cujo nome significa “aquele que sustenta a cidade”. E sustentou mesmo. Quem arrumou a encrenca com os gregos foi Páris, irmão de Heitor, roubando Helena, que era tão simplesmente mulher de Menelau, rei de Esparta. Menelau apela para o irmão, o todo poderoso Agamémnon e aí o sururu está formado. Sob o comando de Agamemnon os gregos preparam uma expedição poderosa com mais de mil navios. Agora só restava aos troianos se refugiar dentro das muralhas e defender a cidade contra os invasores, que vieram com sede de vingança.

Páris, cujo desejo por Helena causara a guerra, não era lá muito valente e foi Heitor que ficou encarregado de liderar o exército troiano contra os gregos. Heitor era destemido e o povo troiano se sentia seguro por detrás das muralhas ao ver seu herói batendo-se contra os gregos. Tudo corria bem e os troianos quase conseguem expulsar os gregos de sua terra. Heitor aproveitava bem o fato de que Aquiles, o principal herói grego, se recusava a combater por conta de uma humilhação que sofrera do comandante da expedição, o arrogante Agamemnon.

Aquiles tinha um amigo do peito, chamado Pátroclo. Pátroclo pensa em um artifício para iludir os troianos e virar o jogo. Pede emprestada a armadura de Aquiles, que era toda decorada, bonita de meter medo, pois encarar Aquiles de frente era morte certa. Aquiles empresta e Pátroclo começa a fazer um estrago no campo de batalha. Até bater de frente com Heitor, que mata sem perdão o amigo de Aquiles.

Aquiles fica louco de dor. Seu urro de tristeza já é suficiente para assustar o exército troiano. O momento decisivo da guerra se dá quando Aquiles, furioso e sedento de vingança por conta da morte de seu amigo Pátroclo, decide pegar em armas novamente. Logo ele e Heitor estão face a face. O duelo decidiria a guerra. Do alto das muralhas, as mulheres, os velhos e as crianças tinham os olhos postos no seu herói, Heitor era a sua única esperança.

Mas não havia verdadeira esperança. Heitor era um simples mortal, filho do amor de um homem e de uma mulher. Já Aquiles era filho de Peleu e da deusa Tétis, cujo casamento acabara causando a confusão que levara à guerra. Heitor não tinha a menor chance. Para piorar, Aquiles está sob a proteção de Palas Atena, a deusa guerreira. Heitor é morto enquanto das muralhas seu pai, sua mulher e seu filhinho assistem horrorizados. Sua morte significava a derrota de Tróia, a destruição da cidade, a escravização das mulheres e crianças.

Aquiles retira a armadura de Heitor e arrasta o corpo do inimigo troiano por duas vezes em torno das muralhas. No acampamento, Aquiles chama um a um os guerreiros gregos pedindo a eles que perfurassem o corpo de Heitor com suas lanças e espadas. Zeus, todavia, não permite que o corpo de Heitor seja ultrajado daquela forma e faz as feridas fecharem assim que são abertas, preservando a beleza do troiano.

É aí que ocorre algo inesperado. Príamo, pai de Heitor, rei de Tróia e um senhor de idade, toma uma decisão temerária, praticamente suicida. Vai até o acampamento grego pedir o corpo do seu filho para poder prestar-lhe as homenagens devidas a um herói. Seria loucura, mas ele recebera a visita de Íris, mensageira dos deuses, que lhe ordenara a missão. E recebe a confirmação de Zeus, que lhe envia uma águia pela direita, o que era de bom augúrio. Ele parte à noite, acompanhado apenas de um velho arauto, ou seja, de um mensageiro. O deus Hermes, a pedido de Zeus, auxilia o soberano, tornando-o invisível para os gregos.

O velho soberano, ajoelhado, suplicando, abraça os joelhos de Aquiles, e beija as mãos que haviam assassinado seu filho. Oferece um resgate pelo corpo de Heitor. Lembra a Aquiles que o pai dele também era idoso e haveria de estar cheio de angústia a pensar no filho que viera a Tróia. Aquiles se emociona e chora. Príamo chora também. Aquiles chora por seu pai e por ele próprio, cujo destino já estava selado: seria para sempre lembrado, mas não iria escapar da morte. Príamo chora por Heitor. Ambos, na verdade, choram pelos comedores da pão que somos nós, por nosso destino inevitável, pela fragilidade da vida.

Agora, ao invés do horror da guerra, temos os funerais de Heitor, reconhecido como um verdadeiro herói. Ou seja, há um raro momento de trégua entre gregos e troianos, um raro momento de paz. Uma paz que é proporcionada pelo reconhecimento mútuo da humanidade de gregos e troianos. Porque gregos e troianos sabiam que a paz não vem na ponta da lança, a paz vem com o respeito e o reconhecimento da humanidade do outro.