CULPA DA LIBERDADE

 

A experiência do serviço militar foi muito ruim. Por conta disso, aprendi muito, saí modificado. Era muito tímido, mas o tempo que considerei perdido naquele quartel de São Cristóvão me fez jurar que pularia o próximo carnaval feito um alucinado. O primeiro foi um bom ensaio, em Teresópolis. Os três seguintes foram da pesada: um em Salvador e dois em Olinda, subindo e descendo ladeira, improvisando passos de frevo, enfim, compensando 300 dias de Exército.

 

Depois da solenidade de formatura, com direito a farda de gala e espada alugada, parte da turma se reuniu na praia para uma cerimônia bastante esperada: os nossos cartões de corte de cabelo, que tinham que ser assinados semanalmente, foram queimados com toda a pompa e circunstância. Só muitos anos depois, na favela de Acari, é que eu viria a conhecer uma expressão capaz de dar conta do que eu sentia: “Feliz que nem pinto no lixo”.

 

Para falar a verdade, a experiência havia sido muito rica. Convivera com pessoas muito diferentes, de classes sociais distintas, com visões de mundo e trajetórias bem diferentes da minha. Fiz dois grandes amigos que conservo até hoje. E, principalmente, pela primeira vez entendi a frase de John Lennon de que a vida é aquilo que te acontece quando você está ocupado fazendo planos.

 

Além disso, havia o esporte, que sempre amei. Representei a Intendência no salto em altura, participei do time de basquete e do time de vôlei. Perna-de-pau demais, no futebol fiquei na reserva. Por isso topei participar do churrasco com pelada proposto pelos oficiais depois do encerramento do curso, embora eu não tivesse a mínima vontade de confraternizar com eles. De qualquer forma, curiosamente naquele dia eu estava atacado. Joguei bem e fiz até um lindo gol mergulhando de peixinho para cabecear. Nisso o “Major Trolha” (ver história “O nome dele começa com B…”) vira pra mim surpreso:

 

– Poxa, Alvito, só agora é que você resolve jogar?

 

Respondi de bate-pronto:

 

– É culpa da liberdade, major…