/MIRE E VEJA JUÍZO FINAL (detalhe da parte inferior direita) (1533-1541) – Michelangelo (1475-1564)

MIRE E VEJA JUÍZO FINAL (detalhe da parte inferior direita) (1533-1541) – Michelangelo (1475-1564)

MIRE E VEJA

JUÍZO FINAL (detalhe da parte inferior direita) (1533-1541), Michelangelo (1475-1564)

Afresco da Capela Sistina, Vaticano

Ainda em vida, Michelangelo teve três biógrafos, algo absolutamente incomum para o seu tempo, mas que atesta o reconhecimento dos contemporâneos quanto ao valor excepcional da sua arte. Michelangelo foi poeta, arquiteto, pintor e escultor. Sua maior paixão era a escultura, o que se refletiu no fato do ciúme que sentia de sua arte: jamais aceitou ter um só discípulo para compartilhar sua excepcional habilidade de escultor, ao contrário da pintura, em que empregou assistentes e não se furtou a ensinar. Logo se tornou o artista mais famoso e bem pago de sua época e não gostava de concorrentes: ele e Leonardo da Vinci se odiavam.

Michelangelo era de temperamento forte e tinha convicções políticas republicanas arraigadas que às vezes lhe obrigaram a mudar de cidade. Ironicamente, as suas encomendas artísticas mais importantes vieram da Igreja, o que ocorreu não sem confrontos, embora os papas tolerassem as convicções do artista por causa do seu talento incomparável. Quando trabalhava na composição do maravilhoso afresco sobre o “Juízo Final”, a Capela Sistina foi visitada pelo Papa Paulo III e por seus prelados. Um deles, o mestre de cerimônias do papa, ficou chocado com a enorme quantidade de nus e afirmou que aquela pintura não era digna, sendo mais apropriada a uma taverna.

Michelangelo, que era vingativo, “homenageou” o mestre de cerimônias retratando-o como Minos, juiz das almas, dotado de duas grandes orelhas de burro e tendo uma serpente em volta do seu corpo, a picar-lhe os genitais (ver parte direita inferior da figura). Reza a lenda que o auxiliar papal, ao se queixar, teria ouvido do papa que, infelizmente, sua jurisdição não alcançava o Inferno.

Polêmica à parte, o “Juízo Final” é uma obra de força impressionante, um tour de force que Michelangelo pintou dos 60 aos 68 anos. Aqui temos apenas a parte inferior direita da enorme cena; nesta porção, temos um retrato do Inferno, da chegada dos infelizes que a ele foram condenados, literalmente tangidos por demônios. O horror da cena, consubstanciado nos olhares de absoluto terror daqueles que estão sendo trazidos à força, é aumentado pela perfeita caracterização do vigor dos corpos musculosos e aparentemente cheios de vida. Estão nus, despidos de qualquer posição ou vaidade. É o contraste que assusta mais do que tudo, com um fundo de céu azul e à direita um avermelhado que lembra o calor das regiões infernais.