ADEUS, TIO MANECO
Papai adorava cinema e ao menos uma vez por semana escapava sozinho para ver qualquer coisa que fosse depois do trabalho. Era uma lembrança do tempo em que, adolescente sem recursos, sua única diversão dominical possível eram as matinês do Cine Politheama no Largo do Machado, com direito a um filme de Flash Gordon servindo de abertura. Ele gostava de evocar o mármore do guichê gasto pelas moedas nele introduzidas para pagar a entrada. Imagino que aquele gesto já deslanchasse nele ondas de prazer.
Mas aos fins de semana também nos levava, a mim e minha irmã, para nossas primeiras sessões de cinema. O filme mais marcante da nossa infância foi, sem dúvida, As aventuras do Tio Maneco. Nanda tinha 7 e eu 10 anos. Fizemos papai nos levar umas sete vezes ao cinema, tarefa que ele cumpriu sem reclamar, talvez feliz em perceber que já tínhamos sido picados pelo amor às telas.
Duas cenas foram rememoradas, debatidas e desfrutadas por meses à fio. Numa delas, se não me engano, Tio Maneco recorre a um assado de formigas por falta de outro alimento. Nós nos perguntávamos se seríamos capazes de fazer o mesmo e se formigas realmente faziam bem para os olhos.
Em outra, a preferida do papai, que sempre o fazia rir e risada do papai era uma pepita de ouro para se guardar com carinho, aparecia um robô. Claro, um robô desajeitado e, principalmente, engraçado. Em uma cena, atordoado por um senhor de idade que não lhe dava sossego, pronunciava a frase:
– Eu não aguento mais esse velho!
É uma ironia trágica que nosso querido Tio Maneco, no final da vida, tenha sentido esta hostilidade.
Para mim, para minha irmã e para os milhões que conseguirem manter vivas as crianças que existem dentro de nós, Tio Maneco vai ser sempre um menino capaz de nos fazer feliz.