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Histórias do Alvito – BLUMENAU 365

Histórias do Alvito
BLUMENAU 365

Histórias do Alvito

BLUMENAU 365

Às vezes o que parece amor pode ser uma isca (meio envenenada) dos deuses, para te tirar do lugar e sacudir sua vida de uma hora para a outra. As águas do rio correm sempre. De repente, você está em Blumenau. E o seu rio passa a ser o Itajaí-Açú, por onde chegaram os primeiros e míticos dezessete colonos em um pequeno barco a vapor. Durante décadas, o rio era a única ligação dos colonos com o mundo.

Você passa a viver cercado de confeitarias, cada uma com seu atrativo: o imbatível pão com bolinho de carne (klops) da Nice, onde também há o pão em forma de rosca que aqui se chama Coruja; os bolos canônicos da Benkendorf; a tradição dos salgadinhos da Dona Hilda e a classe da Portus.

Mas já temos um café amazonense, uma lanchonete iraniana e uma loja de “produtos do Norte”. Os novos alemães são baianos, paraenses, pernambucanos e até venezuelanos. Aqueles com quem conversei disseram que estavam atrás de segurança e de trabalho, nesta ordem. A cidade se torna mais diversa a cada dia. Aceitam até cariocas…

Blumenau já foi modelo de “cidade fábrica”, com uma possante indústria têxtil, bastando dizer o nome Hering. No início da manhã e no fim da tarde as ruas se enchiam de operários e operárias pedalando suas bicicletas. Essa ênfase na produção talvez explique porque a cidade é tão organizada mas, ao mesmo tempo, tenha tão poucas praças.

O que só aumenta a importância da rua quinze (XV de novembro), que sempre foi o coração da cidade e já se chamou Wurst Strasse, ou seja: rua da linguiça. Pois todo mundo sabe que alemão é louco por linguiça e em Blumenau ela é um patrimônio cultural da cidade. Ainda hoje há belos casarões comerciais na rua quinze e até um ou outro prédio construído com a técnica do enxaimel, em que não se usam pregos somente madeira encaixada. Passear pela rua quinze no horário comercial é o mesmo que ter uma amostra da composição da cidade. Adoro.

E onde você encontra um parque com duas trilhas na mata atlântica atrás do principal shopping da cidade? Que cidade tem um bairro com rio de águas límpidas, cachoeiras e floresta feito a Nova Rússia? Ela fica literalmente no sopé do Parque Florestal da Serra do Itajaí.

Meus filhos vieram me visitar e fomos além das fronteiras blumenauenses: passeamos no lindo Jardim Botânico de Timbó, fomos a uma fábrica de chocolate em Pomerode, com sua belíssima zona rural, e é claro que fomos ao Pântano do Sul, em Floripa, lugar sagrado para mim.

Claro que Blumenau tem problemas. Muitos até. Itajaí-açú significa “água grande que corre sobre pedras”. As pedras continuam a existir. Mas o texto de hoje não é sobre os problemas e sim sobre o que Blumenau me deu até agora.

Em Blumenau vivo a experiência de uma cidade de humano tamanho, em que nada é longe, tendo como resultado a abundância da principal matéria-prima da vida: o tempo. Tenho lido mais, me exercitado mais e até escrito mais besteiras por aqui como vocês estão de prova. De início, me sobrava até tempo demais, pois não conhecia ninguém.

Mas agora não tenho um e sim quatro amigos. Desfruto da timidez elegante e inteligente do Martin, da acolhedora sensibilidade da Flávia, do bom humor inabalável da Isabel e da simpatia bonachona do Hugo. E todos nós temos algo em comum, além de não sermos adoradores da bandeira do Brasil. Dentre muitas outras coisas: adoramos comer.

Por isso, no próximo domingo faremos um almoço para festejar nossa amizade e Blumenau 365.

É claro que vai ter linguiça.

EM MAIO: LENDO Cem anos de solidão