NADA É PERFEITO
Parecia perfeito. Nunca tinha conhecido um homem assim. Olhava para ela como um poema apimentado. Gostava de ouvi-la falar, qualquer coisa que fosse. Suspeitou que ele se deleitasse com a voz e não com as palavras. O bom humor é um vírus contagioso. Era pura gentileza, mas de igual para igual. De vez em quando soltava bombas que não eram de chocolate. Disse que o amor por ela respirava, dormia e acordava com ele. Que poderiam dormir, em noites de chuva, usando como cobertor um a pele do outro. O coração dela andava na ponta dos pés com medo de acordar o sonho. Não era bonito, mas não conseguia dizer que fosse feio. Era uma outra categoria. Não sabia como sua alma havia sido sequestrada assim. Só lhe ocorria dizer: leva pra onde você quiser.
Na cama, carne e gozo. O teu desejo é o meu desejo. Sabiam sem perguntar. Ela fechava os olhos e gemia em amor maior. Ele a percorria mil vezes com o olhar. Bebia beleza. Os beijos eram de guerra. Bocas que se atacavam feito dois exércitos, para se fundirem com carinho. Ele a beijava toda. Era louco por seus pés, chupava dedinho por dedinho em um ritual de adoração. As coxas eram outro lugar sagrado. Ela amava.
Nada é perfeito. Quando se encontrou com as amigas na praia, apontaram preocupadas para uma dezena de manchas nos pés e nas pernas. Perguntaram se o novo namorado era canibal. Contrariada, respondeu que era o homem mais doce do mundo. Não as convenceu. Mudaram de assunto. Ficou preocupada. Não havia sentido mordida alguma. Apenas o arrepio dos lábios dele na pele.
Era preciso descobrir. Como é que o beijo virava mordida? Por que ela não sentia nada? Ele explicou que só queria beijar, mas era tão louco por ela que acabava mordendo. Não tinha ideia de como sua amada não sentia, porque as mordidas eram ferozes. Ela insistiu, perguntou por que precisava morder. Ele, feito uma criança descoberta fazendo coisa errada, levantou dois olhos pingando paixão:
— Preciso ter certeza que você existe.
Marcos Alvito