Histórias do Alvito
1989 TRINTA E TRÊS ANOS DEPOIS
Mamãe morria de medo. Em plena ditadura militar, antes da Anistia, antes da Abertura, o filho dela, com dezesseis anos, batia boca com o ditador da vez, o duríssimo General Geisel. Quando este último fazia discursos na televisão, o moleque abusado ia refutando um a um os argumentos apresentados, sem abrir mão de um tom de ferocidade adolescente.
Claro que o general-presidente tinha tanques, aviões e navios, mas também não faltava munição de outro tipo ao seu opositor virtual: o menino de cabelos compridos lia os grandes jornais e o melhor da imprensa alternativa: Pasquim, Opinião, Versus e tudo a que pudesse ter acesso.
Mas, por incrível que pareça, o garoto não se interessava em pertencer a um partido político e quando na faculdade jamais participou do movimento estudantil, embora respeitasse estas instituições. Apenas não tinha o perfil, gostava de se informar, de ter elementos para construir uma visão crítica. Mas preferia a literatura… e o futebol. Para as famosas patrulhas ideológicas, deve ter sido tachado de alienado.
Forma-se em História tendo votado para governador apenas uma vez na vida e sem ter nunca depositado um voto para presidente da república. Ainda teria que esperar cinco longos anos de um dos piores governos da nossa história, marcados pela hiper-inflação causada pelo super-endividamento ocorrido durante a ditadura militar. Eles devoraram o país durante vinte e um anos e deixaram a conta para a gente pagar.
Houve, entretanto, um momento glorioso: a Assembléia Nacional Constituinte que desaguou numa Carta longe de perfeita, mas sem dúvida a melhor e mais avançada Constituição que Pindorama já teve, reconhecendo o direito de populações tradicionais, dos indígenas e dos remanescentes de quilombos, por exemplo.
No ano seguinte, em 1989, aquele garoto agora quase trintão iria votar para presidente pela primeira vez na vida. O segundo turno, todos sabem, foi entre Collor e Lula. Ele tinha sido escalado para trabalhar numa seção eleitoral. Cujo presidente escancarava sua condição de collorido ao mesmo tempo em que nos ameaçava caso de alguma forma exibissemos a preferência contrária. Não se tratava de um grotão e sim da Zona Sul do Rio de Janeiro.
Isso foi muito ruim, mas não foi o pior. A tortura foi perceber que o pretenso Caçador de Marajás estava recebendo uma votação maciça. Esperar vinte e nove anos para ver Fernando Collor subir ao poder. Todos sabem o desastre que foi.
Hoje, todavia, trinta e três anos depois, vejo que a ameaça que só poderemos afastar em outubro é muito maior. Collor era um manipulador da mídia e da população cuja única inovação foi aumentar a porcentagem cobrada em licitações públicas. Um corrupto com um apetite desmesurado.
Neste momento, temos um governo que visa destruir todas as instituições, quebrar sua espinha dorsal para controlá-las: a PF, o Ibama, o MPF, a AGU, o STF e tudo o mais que estiver na frente de um projeto de ditadura 2.0, já implementada em outros países, em que há eleições, há congresso, há presidente … mas não há democracia (vide a Rússia, a Hungria, ambas amigas do Zero-Mor).
O que podemos fazer? Em parte, há uma guerra de informação. No nosso caso, porque no caso do outro lado é uma guerra de desinformação. Ora, todos nós, que temos acesso a Facebook, Twitter, Email, Zap e outras coisas mais, temos o dever moral de publicar, compartilhar, retwittar notícias esclarecedoras, que mostrem o que esse governo vem destruindo.
Portanto, peço a paciência de vocês, mas nos 168 dias que restam para a eleição mais importante para a história do Brasil eu irei inundar o meu facebook com as histórias do apocalipse bolsonárico.
Eu devo isso ao meu país, aos meus filhos e àquele cabeludinho folgado que, mesmo a uma distância saudável, batia boca com generais.
Foto: o General Ernesto Geisel sorrindo.