/HISTÓRIAS DO ALVITO – O homem que tinha PESSOA no nome

HISTÓRIAS DO ALVITO – O homem que tinha PESSOA no nome

O HOMEM QUE TINHA PESSOA NO NOME

A bem dizer, eu havia chegado da Grécia na semana anterior. Ou seja, depois de dez anos dando aula sobre a Grécia antiga eu havia feito uma tese sobre a favela de Acari. Só que a tese não foi o final e sim o começo. O começo de um movimento na direção da cultura afro-brasileira. Comecei pelo samba, frequentando o Puxando conversa, conhecendo a Velha Guarda da Portela (a instituição) e sobretudo indo a muitas rodas de samba. Depois eu me debruçaria um pouco sobre o candomblé e a umbanda, a matriz de tudo.

Mas isso ainda não havia ocorrido quando fui convidado a participar de uma mesa-redonda, se não me engano sobre música e tradição afro-brasileiras. Eu sabia muito pouco do tema, praticamente nada. Estava feliz em participar, sobretudo pela presença de Mestre Darcy da Serrinha, uma lenda do jongo e grande figura humana. Mais feliz fiquei quando ele confirmou uma suspeita que eu tinha, de que ele havia recriado um famoso jongo sobre a abolição para lhe dar um caráter mais engajado e apropriado ao então século XX. Pouco sabia eu do outro componente da mesa, o Prof. José Flávio Pessoa de Barros, o que atesta minha ignorância, pois àquela altura ele era um babalorixá respeitadíssimo e um grande estudioso das religiões afro-brasileiras. Mas pelos livros que ele havia lançado, percebi estar diante de um especialista.

Depois de pedir desculpas por minha ignorância, no começo e ao final, fiquei esperando os reparos e quiçá as broncas do professor e especialista. Eu não estava preparado para o que aconteceu. José Flávio me deu uma doce bronca sim, dizendo não aceitar que eu dissesse nada saber. E mais, afirmou ter certeza de que eu ainda iria fazer pesquisas muito relevantes sobre o tema. Ele errou na previsão, mas nunca mais esqueci aquela gentileza, aquela generosidade tão preciosa e tão rara no meio acadêmico.

Anos depois, já tendo estudado um pouquinho mais sobre as religiões afro-brasileiras, tive a alegria de utilizar o magnífico Galinha d’Angola, livro escrito por Marco Antonio Mello, Arno Vogel e José Flávio Pessoa de Barros. Só então vim a saber que ele era babalorixá e não me surpreendi ao saber que seus filhos o adoravam e que sua morte foi muito sentida e assim o é até hoje.

No breve contato que tive com ele pude perceber sua grandeza, sua humanidade. José Flávio não tinha pessoa somente no nome. Saravá!