/O ÚNICO JEITO

O ÚNICO JEITO

Fim de semana do dia dos Pais, ele resolve se dar um presente. No sábado, pega a filha pequena e sobe a serra para Teresópolis. Passaram um dia perfeito: as brincadeiras de sempre, almoço gostoso no hotel, passeio pela cidade e, o mais importante, treino de futebol.

Depois, o programa foi tomar banho, ler um pouco e ir jantar naquele restaurante que haviam avistado no caminho. Em um bistrô muito agradável, se aquecia com uma sopa de cebola enquanto ela ia beliscando aos poucos um salmão delicioso. Havia até um sujeito tocando bossa nova.

Olhou para sua pimpolha, linda, toda encasacada, cachecol e tudo e pensou: sou um pai feliz. Foi aí que a sua menina começou a chorar. A chorar e a dizer que estava com medo de morrer. Ele a pôs no seu colo, ela encostou sua cabeça no peito do papai, que logo fez um cafuné bem com a pontinha dos dedos.

– Filha, medo de morrer?
– É pai, tenho medo de morrer ainda criança (tinha 7 anos)
– Filha, sem a morte a vida não teria a menor graça
– Como assim?
– É como uma partida que a gente sabe que vai acabar e tem que jogar sempre o melhor possível.
– Mas o tempo da vida a gente não sabe qual é…
– Melhor ainda, temos realmente que viver cada dia como se fosse o último, já que o dia de amanhã não está garantido. Fecha os olhos. Ouve primeiro só o violão, percebe o momento exato em que ele dedilha a corda e como o som se espalha… Ouviu? Agora ouve a voz dele, percebe como ele procura cantar com uma voz suave, dizendo cada palavra de uma vez… Ouviu? Agora abre os olhos…

Ela se acalmou e voltou para a cadeira, olhinhos ainda molhados. Papai desviou um pouco o assunto, fez umas piadas e viu-a sorrir novamente.

Quando saíram na noite gelada, papai resolve contar a verdade. Todo mundo, todo mundo mesmo, sente medo da morte. Papai, uma vez, sentiu tanto medo da morte, tanto medo da morte, que quis morrer para parar de sentir aquele medo.

– Pai você está chorando?
– Estou, papai também chora…
– Papi…
– Papai queria morrer. Mas papai decidiu continuar vivendo quando pensou nos dois filhos que tem. E que não podia dar esse exemplo, desistir de tudo sem lutar até o fim. E que essa é a última coisa que o pai pode dar.
– E agora?
– Agora papai não tem mais medo da morte. Quando ela vier me levar eu vou rir na cara dela e dizer: me leva, não tenho medo de você. Eu vivi sem medo, com alegria.
– Como assim?
– Nessa partida, a morte só te vence se você esquece que está vivo por estar com medo dela. Coragem, filha, pra viver é preciso coragem. É o único jeito.