/SÓ DANDO MAMADEIRA DE PIROCA PRA TODO MUNDO

SÓ DANDO MAMADEIRA DE PIROCA PRA TODO MUNDO

SÓ DANDO MAMADEIRA DE PIROCA PRA TODO MUNDO
Falta de sorte foi nascer nessa joça. Logo eu, Jarri Bundonaro. Todo malandro tem seu dia de azar, mas no meu caso é demais. Sempre gostei de arma, dessa coisa de matar, torturar o inimigo, massacrar, estuprar. Claro que quis me tornar um oficial do Exército de Nova Bruzundanga, uma instituição secular com muita experiência em todas essas modalidades esportivas. Só que não era tão divertido quanto eu pensava. Aí eu bolei um plano: vou fazer de tudo para ser expulso de forma espetacular, chamar atenção e aí mudar de vida, quem sabe me tornar um político. Fiz tudo direitinho, espalhei entre os outros oficiais a ideia de explodir várias bombas em quartéis, hierarquia e disciplina é o cacete. Eu até desenhei, vai que eles não entendem, não é? Expulso? Que nada, inventaram lá umas coisas no Supremo Tribunal Militar da Bruzundanga e eu continuei no Exército. Não tinha mais graça, os caras não tinham coragem nem de expulsar um capitão terrorista?
Fui então para a política, que prometia emoções mais fortes. Comecei devagar, como vereador. Eu não tinha muito dinheiro, mas comecei a usar um esquema muito conhecido de colocar funcionários fantasmas e a embolsar a maior parte do salário deles. Uns chamam de rachadinha, mas a verdade é que eles não levavam nem a metade. Aí, com dinheiro, tudo se torna mais fácil, quando vi tinha chegado no Congresso Nacional. Uma chatice, sessões intermináveis, comissões, estudos… Nunca fui de estudo, tá louco… Eu ficava lá atrás, dormindo ou quase isso. Mas eu tinha que dar um jeito de aparecer. Nisso eu sou bom. Disse para uma deputada que só não a estupraria porque ela é muito feia. Elogiei um torturador em uma sessão muito assistida. A marola foi boa.
O dia-a-dia, entretanto, me torrava a paciência. Pô, vinte e oito anos coçando o saco no plenário, sem vontade alguma de propor alguma lei, afinal essa merda não vai mudar nunca, não tinha mais nada o que fazer. Exceto comer umas mulherzinhas no meu apartamento funcional, não abria mão dos meus direitos como parlamentar. Aí, só de sacanagem, resolvi me candidatar a presidente. Comecei a falar tudo quanto é besteira que me vinha à cabeça, jogando tudo e mais alguma coisa no ventilador. Olha, a Nova Bruzundanga adorou.
Mas o que mudou mesmo foi meu filho Carolo, esse menino é cabeção. Me convenceu a pegar carona na onda conservadora que elegeu Trump. Nada mais de ser o deputado defensor do interesse dos militares da ativa e da reserva. Sai da lama, Jacaré. O negócio era abraçar as ideias mais esdrúxulas, uma espécie de marcha a ré em tudo. Ser ferrenho anticomunista mesmo que não haja mais comunismo. Homem é homem, mulher é mulher, aborto é assassinato, os viados são doentes e os trans são monstruosos. A calda de chocolate disso tudo: Deus, Família e propriedade. É batido mas funciona bem.
Nem eu acreditava, mas fui eleito, tive voto pra dedéu. Como tem otário na Nova Bruzundanga. Pensei que fosse um brinquedo divertido. Que nada, a imprensa caindo de pau, o Supremo me interditando isso e aquilo e aqueles deputados sugadores do Big Center pedindo cada vez mais grana para não me tirarem da cadeira e votarem nas medidas que eu queria.
Fiquei de saco cheio. Resolvi fazer de tudo para impedir a minha reeleição. Quando a peste chegou, me recusei a comprar vacinas e até disse que quem tomasse aquilo viraria rinoceronte. Para garantir que morresse bastante gente, coloquei um general banana para Ministro da Dessaúde. O baixinho fez um bom serviço, morreu gente por falta de oxigênio. Algo revoltante, pensei que fossem tocar fogo em tudo, saquear o palácio, eu teria que fugir de helicóptero, felizão por me livrar desse abacaxi. Não deu certo, teve gente que acreditou em mim, pode? Continuei na minha cruzada de auto-destruição. Pedi aos meus filhos, sempre fiéis, que acelerassem seus muitos esquemas de forma bem chocante, pra todo mundo ver. Adiantou? A imprensa botou a boca no trombone, mostrou por A + B, mas esses advogados que não entendem nada sempre arrumavam uma saída técnica para evitar não só a condenação mas até mesmo o julgamento.
Ministros? Foram minha obra-prima. Coloquei um preto disposto a cuspir no túmulo de Zumbi, caso soubesse onde estava. Outra ministra, brilhante, dotada de uma imaginação prodigiosa, criou a ideia de que o candidato que concorrera comigo planejava a distribuição de mamadeiras de piroca nas creches. Parece ridículo, mas esse povo da Nova Bruzundanga acredita em tudo, eu não sabia mais o que fazer.
A miséria deslanchando, mais de 30 milhões morrendo de fome, as ruas inundadas de mendigos, crakudos, pivetes, uma obra-prima, o que mais eles queriam que eu fizesse? Pensei: vou estimular a compra de armas, os clubes de tiro. Vou puxar o saco das polícias militares, elogiar as chacinas. Não parei por aí, dei carta branca para invadirem as terras indígenas, para meterem a moto-serra na floresta amazônica, para os garimpos ilegais, o tráfico de madeira, gente um quadro maravilhoso de destruição.
Pensei: agora não duro mais seis meses. Quem sabe sou impichado, preso, julgado e entregue ao Tribunal Internacional de Haia. Caramba, ser julgado da mesma forma que alguns dos meus grandes ídolos como um criminoso contra essa porra de Humanidade, invenção de esquerdistas frouxos. Nada disso, gente, tô dizendo, não brinque com a Nova Bruzundanga que ninguém pode adivinhar o que ela vai fazer.
Não é que me colocaram no segundo turno? Tão querendo me reeleger, esses putos. Mas como ainda tenho quatro semanas até lá, já sei o que vou fazer pra que entreguem esse abacaxi ao barbudo:
Nada mais de invadir, o negócio é tomar mesmo as terras dos indígenas na mão grande. Estuprar as indiazinhas, matar os índios e estamos conversados. Vou transformar as universidades em clubes de tiro, o aluguel dos espaços está muito caro. Dar aos viados uma opção: ou eles param com essa frescura ou são castrados de vez. Os trans? A gente reverte os operados. O Brasil volta a ter religião oficial, o neopentecostalismo. A Bíblia se torna leitura obrigatória nas escolas e vamos criar um Supremo Tribunal Bíblico com direito a mandar prender os infiéis. Vou cortar logo essa porra toda de auxílio para os pobres. Deixa eles morrerem de fome e pronto.
Será que é suficiente para esse povo da Nova Bruzundanga finalmente me odiar e parar de votar em mim? Quer saber? Se esses desgraçados quiserem me reeleger, aí é que eu vou mandar distribuir mamadeira de piroca pra todo mundo…
O que mais, Nova Bruzundanga?