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Brasinha manda brasa nos acadêmicos

HISTÓRIAS DO SERTÃO

É muito justo que Brasinha coloque na frente do seu santuário da memória a frase “Aqui já é o sertão”. Porque entrar ali e começar a conversar com ele é o mesmo que passear pelo sertão de Guimarães Rosa. Brasinha conhece toda a obra de Rosa de trás pra frente. Mas nunca diz isso. Não precisa dizer, é algo que se percebe, pelo detalhe, pela intimidade com os trechos e sobretudo pelo olhar iluminado ao citar passagens de Guimarães Rosa, que na fala de Brasinha adquirem vida.

Sendo assim, é claro que este sábio sertanejo não tem muita paciência para a arrogância acadêmica. O termo é meu. Brasinha, como bom rosiano, prefere contar uma história. De forma educada, começa dizendo que respeita os acadêmicos e os considera necessários. Mas que decidiu não ir mais assistir às palestras dos grandes professores durante a semana roseana. Conta que veio uma professora de São Paulo que começou a palestra brigando:

– Este evento existe há 28 anos e vocês só me chamaram agora? E se eu morresse?

Mas teve pior. Certa vez um professor universitário estava proferindo uma palestra sobre o chefe de jagunços Antônio Dó, uma verdadeira lenda do sertão mineiro, como já comentei aqui. Um veredeiro, sertanejo circunspecto, um negro alto chamado Aleixo, ouvia tudo com atenção. E aí o tal professor diz saber como Antônio Dó morreu, que foi assim assado e que ele teria até a certidão. Nisso o Aleixo se levanta – contou Brasinha – muito envergonhado, sem saber onde colocar as mãos. E diz para o professor: o senhor que tem os livros é que sabe, não é mesmo, mas minha mãe diz que Antônio Dó tinha uma capa e corpo fechado pra bala e pra faca. E que segundo a mãe só havia uma maneira de matá-lo e foi assim que ele morreu: bater nele com um pilão e ele ficar coberto de carrapato.

O ilustre acadêmico, se tivesse estudado um pouquinho de História Oral, deveria saber que existem tradições locais e que segundo elas Antônio Dó, exatamente por causa de sua importância, morreu de diversas formas. Mas o professor viu aquilo como uma contestação ao seu saber e sem nenhuma delicadeza ou humanidade, chamou a versão de Aleixo de “fantasiosa”. Uma antropóloga presente, emocionada – chegou até a chorar depois,pontuou que o professor não podia dizer tão simplesmente que a versão de Aleixo era errada. Aleixo, humildemente, reafirmou que o professor devia de estar certo, porque os livros ele é que tinha. Mas perguntou ao Brasinha, ali presente, o que ele achava.

Brasinha não titubeou, dando o xeque-mate no professor:

–   Eu acho que mãe não mente, uai.