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Histórias do sertão – A terra onde menos é mais

HISTÓRIAS DO SERTÃO – A TERRA ONDE MENOS É MAIS

“Para que conto isto ao senhor? Vou longe. Se o senhor já viu disso, sabe; se não sabe, como vai saber? São coisas que não cabem em fazer idéia.”

Era o nosso segundo dia em Andrequicé. Eu acordava cada dia mais cedo, acho que era alegria e vontade de viver. Levantei às 5 horas e Dona Vera já havia aprontado o café e um pãozinho divino que ela fazia no forno de barro e no qual a gente podia passar uma manteiga caseira de lamber os beiços. Esperei um pouco e tomei meu café na presença iluminada de Dona Vera, a senhora que era dona da casa e que nos recebeu com muita simplicidade e carinho. Ela parece sorrir em paz, com a alma florida.

Depois apareceu o marido, Seu Onilo. Primeiro estava um pouco desconfiado, mas depois conversou de coração aberto. Lamentou o desaparecimento dos cursos d`água da região, o que ele atribui ao plantio de eucaliptos, que por cobiça se faz até nas margens dos rios e até em nascentes. De fato, Andrequicé parece até uma ilhazinha de gente em meio a um mar de eucaliptos. O eucalipto tem raízes bem verticais, ele suga a água das profundezas e arrasa o solo em torno, ele é morte verde. Tudo isso para fazer carvão. É uma tragédia ambiental anunciada.

Depois disso, fomos pro terreiro da casa. Ali Dona Vera mantém uma pequena horta de alho, alface e cebola. Aparece para prosear um amigo do casal e em seguida meus amigos Gustavo e Yan. Seu Onilo, então com 76 anos, disse que vai continuar na roça enquanto tiver forças. Vai a cavalo por 15 quilômetros até a propriedade, onde tem seus boizinhos, suas vaquinhas.

E ficamos ali, fingindo não fazer nada. Ninguém contava uma história espetacular, ninguém falava alto, ninguém dava gargalhada. Uns em pé, outros sentados mansamente em tocos de árvores, ali estavamos, proseando com calma, com uma doçura disfarçada. Copo de cafezinho na mão, mordendo aquele pãozinho, olhando uns para os outros. Sem necessidade de nenhuma declaração, pois a amizade estava é na qualidade do silêncio.

Minas é a terra onde o menos é mais.