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IMPLICÂNCIAS BASQUETEIRAS

Do alto do seu um metro e setenta e sete de altura, meu pai jurava que havia jogado de pivô no time juvenil do Flamengo no início da década de 40. Depois ele foi fazer faculdade de veterinária, casou com minha mãe e nunca mais entrou em uma quadra.
Mas a sua paixão pelo basquete era incendiária e ele me ensinou a ver um jogo como quem lê um texto. Quando os primeiros jogos da NBA passaram na televisão ele avisou, entre o sério e o divertido, que daqui a pouco estariam fazendo o mesmo por aqui. Afinal, no esporte como em muitas coisas mais, o corpo aprende vendo e criando uma memória.
Infelizmente a profecia dele se cumpriu. Pois eu acho a “enterrada” o enterro do basquete. Eventualmente, quando derivam de um belo passe, de uma jogada bem trabalhada, merecem a minha aprovação. Mas quando um jogador simplesmente usa a força para abrir espaço no garrafão e enterra a bola na cesta com toda a raiva e nenhuma arte, nesse caso é uma jogada estúpida. Quase uma lei do mais forte das quadras.
Há também a turma das acrobacias no ar, das piruetas, triplos saltos mortais carpados, coisas assim. Se eu gostasse de trapezistas, iria ao circo. Eu gosto de basquete.
Isso é só metade da implicância. O pior é que esses especialistas em enterradas muitas vezes “andam” escandalosamente, agarrando e carregando a bola por 30 metros feito jogadores de rugby. E os juízes e juízas (há juízas na NBA, mas desconfio que é uma só pois só vejo a mesma) ignoram aquilo ainda mais escandalosamente em nome do espetáculo, sobretudo quando o enterrador é uma estrela. Zion Williamson, por exemplo. Os próprios comentaristas da televisão, entre a cruz e a caldeirinha, comentam envergonhados: — É, ele andou um bocadinho…
Pois há aqueles e aquelas que preferem a brutal e sem sabor enterrada aos dribles garrinchescos de Kyrie Irving, às bolas de três canonicamente perfeitas de um Stephen Curry, aos passes venenosos de Nikola Jokic, ao saracoteio imarcável e à pontaria assassina de James Harden. Para ficarmos somente em alguns exemplos.
Há jogadores que sabem enterrar, até mesmo fazendo gracinhas, derrubando o adversário (isso vale ponto no boxe, mas não no basquete) etc e tal. Mas não sabem dar um passe, penam para acertar um lance livre e se tentarem quicar a bola terão a carteira batida em segundos. Não são jogadores de basquete, são coveiros, profissão de quem vive de enterrar.
Tá certo, eu exagerei, difamei, ataquei, provoquei.
Eu avisei que era uma implicância. Estava precisando botar para fora, não podia mais continuar com isso enterrado na minha alma basqueteira.
P.S: é apenas como eu sinto e vejo o jogo. Não é nenhuma verdade, nem pretende ser, OK? Discorde à vontade, mas não precisa passar por cima de mim que nem Joel Embidii faz com aqueles que ousam marcá-lo.