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PIADA DE PORTUGUÊS

PIADA DE PORTUGUÊS

Calma, não vou contar piada de português, não sou suicida, as PPCs estão à solta. Patrulhas do Politicamente Correto. Mais ferozes do que os White Walkers de Game of Thrones, mas sem tanta classe. Um dia as piadas ainda serão estudadas pelos arqueólogos de civilizações perdidas. Sou tão antigo que na minha época se contava piada até na universidade, veja só.

Lembro que certo dia sentamos no bar, eu e mais dois amigos. Eu, filho de mãe portuguesa, um deles historico-sociologicamente negro e o outro historico-sociologicamente judeu. Fizemos um trato esquisito e passamos a tarde nos divertindo. Era um rodízio de piadas. Mas com uma regra: eu só podia contar piada de português, o negro só podia contar piada de negro e o judeu só podia contar piada de judeu. Funcionou bem. Rir de si próprio era um bom exercício. Rimos também uns dos outros, foi um relaxamento, uma brincadeira. Continuamos bons amigos.

Talvez por conta dessa experiência, cometi uma gafe e tanto anos depois. Estava em Portugal, terra dos meus avós maternos e onde ainda tenho uma família maravilhosa. Zé, um dos meus primos, um pouco mais velho que eu, é uma pessoa interessantíssima, inteligente, politizado sem ser chato e o melhor anfitrião que há no planeta. Ele não faz você se sentir em casa, faz você se sentir melhor do que na sua casa. É daquelas pessoas que sabem aproveitar a vida, capaz de viajar horas com a família até a Serra da Estrela, com o pretexto de comprar um queijo artesanal incomparável, na verdade para ir se divertindo na ida e na volta. Sem falar no queijo, é claro. Zé, que além de tudo é cineasta e professor, levou-me com ele a passar um dia no seu trabalho. Estavam filmando uma ficção científica e o meu primo era o diretor de fotografia.

Na hora do almoço, fomos para uma boa tasca lusitana onde comi um inesquecível Bacalhau a Gomes de Sá. Retribui aquela hospitalidade com uma grosseria inominável. Tão simplesmente comecei a contar piadas de português diante de todos. Não sei o que eu tinha na cabeça, ou talvez não tivesse, que achava que seria engraçado para eles, portugueses, ouvirem piadas de português.

Como eram todos educadíssimos, seguiu-se um silêncio de pedra após a última piada. Sim, foram umas duas ou três. Não contente, tornei a emenda pior do que o soneto:

– E vocês? Ninguém vai contar uma piada de brasileiro?

Foi aí que um deles não resistiu e respondeu, na maior categoria:

– Não é preciso. Estão todos os dias nos jornais…