/Professor não, prefiro ser motorista de ônibus

Professor não, prefiro ser motorista de ônibus

PROFESSOR NÃO, PREFIRO SER MOTORISTA DE ÔNIBUS
 
Depois de um aniversário de criança, enfrentei duas horas de engarrafamento em um Uber, com dois meninos no banco de trás quicando mais do que bola de basquete. Mesmo assim, foi uma experiência interessante. O motorista era um rapaz de trinta e poucos anos – qualquer um com vinte anos a menos que eu é rapaz ou moça. Batemos um longo papo, que girou em torno da questão da escolha de profissão. Além de ser motorista de Uber para reforçar o orçamento, Silvio tem como principal fonte de sustento sete horas por dia à frente do volante de um ônibus na heróica linha Campo Grande-Praça Tiradentes.
 
Na verdade, ele cursou Matemática até o fim em uma faculdade privada da Zona Oeste. Durante o curso, pedia aos professores que transformassem os vôos teóricos em alguma coisa que ele pudesse utilizar em sala de aula com os adolescentes que teria como alunos. Sua primeira experiência como professor foi trágica. Escalado para dar aula de recuperação a alunos da Favela do Barbante, tinha em mãos uma turma em que muitos alunos já chegavam “doidões”. Mesmo assim, Silvio não desistia:
 
– Durante meia hora eu conseguia trazê-los para o meu mundo, mas depois disso…
 
Silvio não tinha dificuldade em ensinar. Ele gosta de fazê-lo, gosta da disciplina:
 
– Eu sei corrigir os erros dos alunos, sei dizer exatamente onde o raciocínio se perdeu ou falhou.
 
Mas quando ele percebeu que além das dificuldades ele ganharia pouco, levaria uma montanha de trabalhos para casa, inclusive no fim de semana, resolveu ser policial militar. Passou na prova e quando estava prestes a fazer o curso, teve a notícia de que um amigo que já estava na PM tinha tomado um tiro. Desistiu:
 
– Aquilo lá não é vida…
 
Foi assim que um futuro professor de Matemática de mão cheia teve que por as mãos no volante de um ônibus lotado de uma companhia recordista em reclamações. Ele contou isso sem nenhum drama. Está simplesmente buscando um futuro melhor para si e para sua família: ele e a esposa têm uma menina pequena.
 
Talvez não seja nenhuma tragédia para Sílvio, mas com certeza é alarmante que a carreira de professor seja menos atraente do que carreiras essenciais à sociedade mas que são marcadamente difíceis e perigosas e estão longe de ser regiamente remuneradas.
 
Para onde irá uma sociedade em que a carreira de professor parece ser uma espécie de tabu?