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QUEM DISSE QUE EU QUERO GANHAR?

Ainda estávamos no final do século XX quando fizemos uma viagem para visitar parte da família que morava em New Jersey. Para mim era sobretudo a chance de rever o João, um sobrinho muito querido, àquela altura com mais de dois metros e que em breve se tornaria o astro do time de basquete da sua escola.
Eu e ele praticamente só conversávamos sobre basquete e nos pusemos de acordo em torcer para o time do estado, à época o New Jersey Nets. Era um time fraco, sem grandes jogadores e com zero chances de ganhar algo naquele momento. Mas era o nosso time e pronto.
Fomos ver um jogo deles contra o Indiana na estréia de Larry Bird como técnico. Eles tinham Reggie Miller, alto e magrelo feito uma vareta, mas que atirava bolas de três com uma perfeição de câmera lenta, fazendo a gente sofrer antes até de atravessar o aro. Eu, João e o pai dele estávamos nos últimos degraus das arquibancadas quase vazias, junto com um grupo de jamaicanos. Fizemos um carnaval e o Nets, milagrosamente, venceu.
Depois o time melhorou muito, tivemos a era Jason Kidd, um dos jogadores mais inteligentes que já vi jogar. Arremessava muito bem, penetrava no garrafão, quase não errava lances livres. Uma astúcia de raposa na distribuição de bolas que fazia com que todos melhorassem as suas atuações. O Nets chegou a ganhar o título da Conferência Leste, o maior já obtido pela “franquia” até hoje na NBA.
Depois veio um longo período de mediocridade, encarada com normalidade por quem é torcedor do Nets. Até que uns três ou quatro anos atrás, lentamente, a equipe começou a melhorar, foi formando um bom conjunto e chegou até os playoffs. Para ser eliminada na primeira rodada, mas com aquele gosto de estamos chegando lá. Eu assistia aos jogos sabendo que éramos quase sempre os underdogs mas que era possível vencer. O time se entregava 100% e as derrotas não me perturbavam, eram compensadas por vitórias milagrosas.
Até que o Nets resolveu comprar um título. E contratou três dos melhores jogadores da NBA. E três dos mais problemáticos também. Kyrie Irving é um gênio com a bola nas mãos, talvez nunca tenha existido nem nunca vai haver jogador tão habilidoso. Ele é um contorcionista para penetrar em garrafões lotados de adversários e se espremer até fazer a cesta. James Harden é uma máquina de fazer pontos. E Kevin Durant um perpétuo candidato a ser o melhor jogador do ano.
Até aí, tudo bem. Mas Kyrie é imprevisível e nesta temporada esteve fora uns tempos sem revelar o motivo. Se era um protesto, não ficamos sabendo. Harden veio para o Nets depois de dar uma entrevista dizendo que seus companheiros do Houston não eram bons o suficiente. Dá para confiar? Durant se tem em tão alta conta que quando um repórter ousou fazer aquela pergunta clássica: – Quem é Kevin Durant?, Durant só faltou espumar e respondeu que todo mundo sabe quem é Kevin Durant.
Harden está fora machucado, não se sabe quando volta. Durant já esteve fora duas vezes por desrespeitar o protocolo do Covid, deve achar desnecessário colocar outra máscara. Kyrie Irving faz mais de 30 pontos quase todo jogo, mas mesmo assim o time perde, porque ele não faz os companheiros jogarem melhor e é péssimo jogador de defesa.
O time perde jogando sem vontade, achando talvez que a vitória virá até eles como uma cadelinha amestrada. O restante do time fica sempre na posição desalentadora de coadjuvante dos grandes astros. Tudo isso por uma promessa de título que não vai se realizar.
Não quero saber de ganhar. Só quero o meu Nets de volta.