/SENTIMENTO DO MUNDO – A potência da poesia

SENTIMENTO DO MUNDO – A potência da poesia

“Se em 1928 ou 1941 , se exigia, frente à pedra de Drummond, que a poesia fosse mais ‘poética’, isto é, mais metafórica, mais ‘elevada’ e mais conforme aos padrões estéticos reconhecidos (isto é, que fosse supostamente ‘verdadeira’ poesia), forças de pressão atuais exigem que, como tudo, ela se justifique através de uma tradução simplificada e utilitária de suas intenções, que se reduza a um significado secundário que a explique (ou seja, que não seja poesia). Se, mesmo para quem atacava o poema de Drummond no passado, o que estava em jogo era a cultura como baliza de autorreconhecimento da sociedade, no panorama atual, em que o espaço público se encontra em linha de faccionalização, e no qual a cultura deixou de ser essa referência de autorreconhecimento social, pretende-se da poesia, se for o caso, que ela diga o que está pretendendo dizer, ou que se cale para sempre. Acontece que o que a poesia está querendo dizer é inseparável do que ela diz, e em nenhuma das manifestações da linguagem humana isso é tão patente – e tão potente. É isso que lhe permite furar os estereótipos mentais de sua época, e é isso que acontece na poesia de Carlos Drummond de Andrade.

[grifo de M.A.]

WISNIK, J.M. Maquinação do mundo: Drummond e a mineração. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 22.