“Sons de sinos – que não deixam de ser, afinal, a emanação aérea do ferro – comparecerão, mesmo ausentes, enquanto disparadores do tempo perdido e desencontrado na grande cidade, em poemas escritos no Rio de Janeiro, como ‘Anoitecer’ (‘é a hora em que o sino toca,/ mas aqui não há sinos’), ‘Fraga e sombra’ (‘um sino toca, e não saber quem tange/ é como se este som nascesse do ar’), ‘Reportagem matinal’ (‘Eis que ouço a batida nítida/ no azul rasgado ao meio/ perto/ longe/ no tempo/ em mim.// Quando a palavra já não vale/ e os encantos se perderam,/ resta um sino’). Os grandes saltos metafísicos da poesia de Drummond são disparados pela memória do som crepuscular e ‘rouco’ do signo-sino, que dá a ver a face do enigma (n”A máquina do mundo’) e precipita o mergulho no ‘âmago de tudo’, na dor universal, no ‘choro pânico do mundo’ (em ‘Relógio do Rosário’).”
(p. 31-32)