Quantos caminhos um homem precisa percorrer até poder ser chamado de um homem? Mudando um pouco os versos de Blowin’ in the wind, que abre o segundo LP de Dylan, The Freewheelin Bob Dylan, poderíamos perguntar: quantos trabalhos um artista precisa fazer até descobrir sua voz?
No caso do garoto de 22 anos com o nome artístico de Bob Dylan, depois de um primeiro LP em que ele experimentava possibilidades, no segundo álbum, Dylan, como diz o título, já é dono da sua vontade, já é livre. Se na primeira capa o mocinho aparecia sentado de bonezinho, bem comportadamente segurando seu violão, agora ele aparece caminhando pelas ruas cobertas de neve, de braços dados com a namorada Suze Rotolo. Em movimento, como estaria daquele momento em diante.
Embora todo o LP seja uma mescla de baladas de amor perdido e de canções de protesto, decidi destacar uma música que continua bem atual, talvez mais atual, 55 anos depois. Masters of War é a terceira música do lado A e parece profética, quando o poeta canta contra os engravatados donos da guerra em 1963. A Guerra Fria estava em um dos seus momentos mais quentes, no ano anterior tinha havido a crise dos mísseis de Cuba, um momento em que o mundo esteve perto de uma guerra nuclear. Dois anos depois da música, os Estados Unidos enviariam maciçamente tropas ao Vietnã. Masters of war, acabou se tornando uma das maiores músicas de protesto da história, que poderia ser cantada nos quatro cantos do globo ainda hoje.
A letra dispensa comentários, mas percebam o tom de desafio e a contundência do poeta, não é um lamento, é um enfrentamento, com direito a vingança.
Vai aqui uma tradução bem livre, seguida do texto original:
“Venham cá, senhores da guerra
Vocês que fabricam todas as armas
Vocês que fabricam todos os aviões da morte
Vocês que fabricam todas as grandes bombas
Vocês que se escondem atrás das muralhas
Vocês que se escondem atrás de mesas
Eu só queria que vocês soubessem
Que eu posso ver através das máscaras de vocês
Vocês que nunca fizeram nada
Mas fabricam para destruir
Vocês brincam com o meu mundo
Como se fosse o brinquedinho de vocês
Vocês colocam uma arma na minha mão
E se escondem do meu olhar
E se viram e correm para longe
Quando as balas rápidas voam
Como o velho Judas
vocês mentem e enganam
Que uma guerra mundial vencida
Vocês querem que eu acredite nisso
Mas eu vejo nos dentro dos seus olhos
E posso ver através da sua mente
Como vejo através da água
Que escorre pelo ralo lá de casa
Vocês armam todos os gatilhos
Para os outros atirarem
E depois se recostam e assistem
Quando o número de mortes só aumenta
Você se esconde em sua mansão
Enquanto o sangue de pessoas jovens
Escorre dos seus corpos
E é enterrado na lama
Vocês trouxeram o maior medo
Que jamais poderia ser lançado
Medo de trazer crianças
ao mundo
Ao ameaçar meu bebê
Antes de nascer e de ter nome
Você não é digno do sangue
Que corre em suas veias
O que é que eu sei
Para falar fora da minha vez
Vocês podem dizer que eu sou jovem demais
Vocês podem dizer que não tenho escolaridade
Mas tem uma coisa que eu sei
Embora seja mais jovem que vocês
Nem mesmo Jesus jamais
os perdoaria
Vou fazer uma pergunta
Seu dinheiro é tão bom
Que possa comprar seu perdão
Será que vocês pensam que sim
Acho que vocês irão descobrir
Quando a sua morte vier
Todo o dinheiro que fizeram
Não vai comprar sua alma de volta
E eu espero que vocês morram
E a morte de vocês virá logo
Eu seguirei o caixão
No pálido entardecer
E verei quando vocês forem depositados
Embaixo, na sua cama de morte
E vou pisar e ficar de pé sobre o seu túmulo
Para ter certeza de que você está morto.
Come you masters of war
You that build the big guns
You that build the death planes
You that build all the bombs
You that hide behind walls
You that hide behind desks
I just want you to know
I can see through your masks
You that never done nothin’
But build to destroy
You play with my world
Like it’s your little toy
You put a gun in my hand
And you hide from my eyes
And you turn and run farther
When the fast bullets fly
Like Judas of old
You lie and deceive
A world war can be won
You want me to believe
But I see through your eyes
And I see through your brain
Like I see through the water
That runs down my drain
You fasten the triggers
For the others to fire
Then you set back and watch
When the death count gets higher
You hide in your mansion
As young people’s blood
Flows out of their bodies
And is buried in the mud
You’ve thrown the worst fear
That can ever be hurled
Fear to bring children
Into the world
For threatening my baby
Unborn and unnamed
You ain’t worth the blood
That runs in your veins
How much do I know
To talk out of turn
You might say that I’m young
You might say I’m unlearned
But there’s one thing I know
Though I’m younger than you
Even Jesus would never
Forgive what you do
Let me ask you one question
Is your money that good
Will it buy you forgiveness
Do you think that it could
I think you will find
When your death takes its toll
All the money you made
Will never buy back your soul
And I hope that you die
And your death’ll come soon
I will follow your casket
In the pale afternoon
And I’ll watch while you’re lowered
Down to your deathbed
And I’ll stand o’er your grave
‘Til I’m sure that you’re dead