ADORÁVEL (cont. – final)
“4. Adorável é o vestígio fútil de um cansaço, que é o cansaço da linguagem. De palavra em palavra me esforço para dizer de outro modo o mesmo da minha Imagem, impropriamente o próprio de meu desejo: viagem ao término da qual minha última filosofia só pode ser reconhecer – e praticar – a tautologia. É adorável o que é adorável. Ou ainda: adoro você porque você é adorável, te amo porque te amo. Assim, o que fecha a linguagem amorosa é aquilo mesmo que a instituiu: a fascinação. Pois descrever a fascinação não pode nunca, no fim das contas, ultrapassar este enunciado: ‘estou fascinado’. Ao atingir a extremidade da linguagem, lá onde ela não pode senão repetir sua última palavra, como um disco arranhado, me embriago de sua afirmação: a tautologia não é esse estado inusitado, onde se acham misturados todos os valores, o fim glorioso da operação lógica, o obsceno da tolice e a explosão do sim nietzcheano?”
Roland Barthes. Fragmentos de um discurso amoroso. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1981.