“Paralisado durante muito tempo por este dilema, julgo no entanto que a agitação começa a acalmar. Formas evanescentes tornam-se mais distintas, a confusão dissipa-se lentamente. (…) Acontecimentos sem relação aparente entre si, provenientes de períodos e regiões heteróclitos, deslizam uns sobre os outros e imobilizam-se repentinamente num simulacro de castelo cujo projeto teria sido meditado por um arquiteto mais cuidadoso do que a minha história. ‘Cada homem (escreve Chateaubriand) traz consigo um mundo constituído por tudo o que viu e amou e no qual penetra a todo instante ao mesmo tempo que percorre e parece habitar um mundo estranho’ (Viagem à Itália). De agora em diante, a passagem já é possível. De forma inesperada, o tempo alongou seu istmo entre mim e a vida. Foram necessários vinte anos de esquecimento para que eu conseguisse enfrentar uma experiência antiga cujo sentido me tinha sido negado e cuja intimidade me tinha sido roubada por uma perseguição tão longa como a própria terra.”
Claude Lévi-Strauss. Tristes Trópicos. Lisboa: Edições 70, 1981.