/O DRUMMOND NOSSO DE CADA DIA – Rua do olhar

O DRUMMOND NOSSO DE CADA DIA – Rua do olhar

O DRUMMOND NOSSO DE CADA DIA

RUA DO OLHAR

Entre tantas ruas
Que passam no mundo
A Rua do Olhar,
Em Paris, me toca.

Imagino um olho
Calmo, solitário,
A fitar os homens que voltam cansados.

Olhar de perdão
Para os desvarios,
De lento conselho
E cumplicidade.

Rua do Olhar:
As casas não contam,
Nem contam as pedras,
Inertes no chão.

Só conta esse olho
Triste, na tarde, percorrendo o corpo,
Devassando a roupa…

A luz que se acende
não te ilumina
O brilho sem brilho,
a vaga pestana
desse olho imóvel
oscilam nas coisas
(são apenas coisas
mas também respiram).
E pela noite abaixo
uma vida surda
embebe o silêncio,
como frio no ar.
Sinto que o drma
já não interessa.
Quem ama, quem luta,
quem bebe veneno?
Quem chora no escuro,
quem se diverte
ou apenas fuma
ou apenas corre?
Uma rua – um olho
aberto em Paris
olha sobre o mar.
Na praia estou eu.
Vem, farol tímido,
dizer-nos que o mundo
de fato é restrito,
cabe num olhar.
Olhar de uma rua
a quem quer que passe.
Compreensão, amor
perdidos na bruma.
Que funda esperança
perfura o desgosto,
abre um longo túnel
e sorri na boca!
E sorri nas mãos,
no queixo, na rosa,
no menor dos bens
de ti, meu irmão!