todos esses personagens divinos, com Éris de um lado, Eros de outro, vão se enfrentar e combater-se”
“Nessa altura, todos esses personagens divinos, com Éris de um lado, Eros de outro, vão se enfrentar e combater-se. Por que vão lutar? Menos para formar o universo, cujas bases já estão assentadas, e mais para designar o senhor desse universo. Quem será o soberano? Em vez de um relato cosmogônico que faz as perguntas: ‘O que é o começo do mundo? Por que o Caos primeiro? Como foi fabricado tudo o que o universo contém?’, surgem outras perguntas, a que outros relatos, muito mais dramáticos, tentam responder: De que modo os deuses, que foram criados e por sua vez engendram, vão lutar e se dilacerar? Como vão se entender? Como os Titãs deverão expiar a falta que cometeram contra o pai Urano, como serão castigados? Quem vai garantir a estabilidade deste mundo construído a partir de um nada que era tudo, de uma noite da qual saiu até a luz, de um vazio do qual nascem o cheio e o sólido? Como o mundo vai se tornar estável, organizado, com seres individualizados? Ao se afastar, Urano abre caminho para uma série ininterrupta de gerações. Mas, se a cada geração os deuses lutarem entre si, o mundo não terá nenhuma estabilidade. A guerra dos deuses deve chegar ao fim para que a ordem do mundo seja definitivamente estabelecida. Levanta-se a cortina do palco onde serão travadas as lutas pela soberania divina.”
Jean-Pierre Vernant, “Discórdia e amor” In: O Universo, os Deuses, os Homens – os mitos gregos contados por Jean-Pierre Vernant. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.