VIVEIROS DE CASTRO – A mais alta promessa da antropologia
“Uma expressão feliz de Patrice Maniglier, pela qual esse filósofo define o que chamou de mais alta da antropologia, a saber, ‘devolver-nos uma imagem de nós mesmos na qual não nos reconheçamos’, ganha em A queda do céu um sentido simétrico e inverso ao sentido visado, o que, longe de desmentir, enriquece a definição com uma inesperada dobra irônica adicional. Impossível, de fato, não nos reconhecermos nessa caricatura fielmente distorcida de nós ‘mesmos’ desenhada, para nosso escarmento, por esse ‘nós’ outro, esse outro que entretanto insiste em advertir que somos, ao fim e ao cabo (mas talvez apenas ao fim e ao cabo), todos os mesmos, uma vez que, quando a floresta acabar e as entranhas da terra tiverem sido completamente destroçadas pelas máquinas devoradoras de minério, as fundações do cosmos ruirão e
15: o céu desabará terrível sobre todos os viventes. Isso já aconteceu antes, lembra o narrador. O que é o modo índio de dizer que acontecerá de novo.”
“O recado da mata”, Prefácio de Eduardo Viveiros de Castro
Davi Kopenawa e Bruce Albert. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. pp. 14-15.