Abismar-se (continuação – 3)
“3. Quando me acontece de me abismar, é que não há mais lugar para mim em parte alguma, nem na morte. A imagem do outro – à qual estava colado, da qual vivia – não existe mais; ora é uma catástrofe (fútil) que parece me afastar para sempre, ora é uma felicidade excessiva que me faz recuperá-la; de qualquer modo, separado ou dissolvido, não sou recolhido em lugar nenhum; diante de mim, nem eu, nem você, nem um morto, nada mais a quem falar.
(Estranhamente, é no gesto extremo do Imaginário apaixonado – aniquilar-se para poder ser afastado da imagem ou confundir-se com ela – que se realiza uma queda desse Imaginário: o breve momento de uma vacilação e perco minha estrutura de enamorado: é um luto factício, sem elaboração, algo como um não-lugar).”
Roland Barthes. Fragmentos de um discurso amoroso. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1981.