O DRUMMOND NOSSO DE CADA DIA
GIRASSOL
Aquele girassol no jardim público de Palmira.
Ias de auto para Juiz de Fora; a gasolina acabara;
havia um salão de barbeir; um fotógrafo; uma igreja; um menino parado;
havia também (entre vários) um girassol. A moça passou.
Entre os seios e o girassol tua vontade ficou interdita.
Vontade garota de voar, de amar, de ser feliz, de viajar, de casar, de
[ter muitos filhos;
vontade de tirar retrato com aquela moça, de praticar libidinagens,
[de ser infeliz e rezar;
muitas vontades; a moça nem desconfiou…
Entrou pela porta da igreja, saiu pela porta dos sonhos.
O girassol, estúpido, continuou a funcionar.”
Carlos Drummond de Andrade. Nova reunião: 23 livros de poesia – Volume 1. Rio de Janeiro: Bestbolso, 2010. 3.ed.