Características do capitalismo e sua ligação com o industrialismo e o controle dos meios de violência
“O empreendimento capitalista, podemos concordar com Marx, desempenhou um papel importante no afastamento da vida social moderna das instituições do mundo tradicional. O capitalismo é em alta conta inerentemente dinâmico por causa das conexões estabelecidas entre o empreendimento econômico competitivo e os processos generalizados de transformação em mercadoria. Por razões diagnosticadas por Marx, a economia capitalista, tanto interna quanto externamente (dentro e fora do alcance do estado-nação), é intrinsecamente instável e inquieta. Toda reprodução econômica no capitalismo é ‘reprodução expandida’, porque a ordem econômica não pode permanecer num equilíbrio mais ou menos estático, como era o caso na maioria dos sistemas tradicionais. A emergência do capitalismo, como diz Marx, precedeu o desenvolvimento do industrialismo e na verdade forneceu muito do ímpeto para sua emergência. A produção industrial e a constante revolução na tecnologia a ela associada contribuem para processos de produção mais eficientes e baratos. A transformação em mercadoria da força de trabalho foi um ponto de ligação importante entre capitalismo e industrialismo, porque o trabalho abstrato pode ser diretamente programado no projeto tecnológico de produção.
O desenvolvimento da força de trabalho abstrato também constitui um ponto de conexão importante entre capitalismo, industrialismo e a natureza cambiante do controle dos meios de violência (…) Nos estados pré-modernos, os sistemas de classe raramente eram econômicos por inteiro: as relações explorativas de classe eram em parte mantidas pela força ou pela ameaça de seu uso. A classe dominante era capaz de dispor de tal força através do acesso direto aos meios de violência – ela era frequentemente uma classe de guerreiros. Com a emergência do capitalismo, a natureza da dominação de classe tornou-se substancialmente diferente. O contrato de trabalho capitalista não repousa sobre a posse direta dos meios de violência, e o trabalho assalariado é nominalmente livre. As relações de classe tornaram-se assim diretamente incorporadas no interior da estrutura da produção capitalista, ao invés de serem abertas e sancionadas pela violência. Este processo ocorreu em conjunção histórica com a monopolização dos meios de violência nas mãos do estado. A violência, tal como era, foi ‘expelida’ do contrato de trabalho e concentrada nas mãos das autoridades do estado.”
GIDDENS,Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: UNESP, 1991. p.66-68.