/ROSIANA 017 – O sertão no plano mítico

ROSIANA 017 – O sertão no plano mítico

Sertão

“o sertão surgirá sempre como terra sem lei, ‘onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado’. Sertão ainda igual ao dos relatórios dos tempos coloniais que falavam de homens absolutos [grifo do autor], sem Deus, sem rei. Mundo de homens solitários, cruzando os cerrados e gerais, sem nome, sem história.” (43)

“Travessia perigosa. Sertão não protege ninguém. Só é a favor de jagunço porque ele compendia as virtudes físicas do mestre em ofícios e habilidades da vida (43)
rústica e defende a terra primitiva contra o avanço da civilização, enfrentando a autoridade, peito a peito. O sertão se alia a essa luta, repelindo o invasor.” (44)

P.ex. Zé Bebelo, que queria conquistar e destruir o sertão civilizando-o, mas que foi vencido pelo sertão e julgado por ele, como lhe diz Joca Ramiro: ‘Adianta querer saber muita coisa? O senhor sabia lá para cima – me disseram. Mas, de repente, chegou nesse sertão, viu tudo diverso, diferente, o que nunca tinha visto. Sabença aprendida não adiantou para nada… Serviu algum?’ ” (44)

“O julgamento de Zé Bebelo é o diálogo entre sertão e cidade, adversários que nenhuma aliança jamais unirá” (44)

O crime de Zé Bebelo nas palavras de Joca Ramiro: ‘O senhor veio querendo desencaminhar os sertanejos de seu costume velho de lei…’ (44)

Neste costume de jagunço, guerrear e matar não eram crime e sim, nas palavras de Sô Candelário:
‘Crime, que sei, é fazer traição, ser ladrão de cavalos ou de gado… não cumprir a palavra…’ (45)

Zé Bebelo volta e trai ao chamar os soldados do governo para o sertão, o que é percebido por Riobaldo, que passa a negá-lo como chefe. (45)

Mesmo assim, Riobaldo admirava Zé Bebelo, é esta a fraqueza do sertão: “admirar a cidade, invejar a inteligência construída sobre o raciocínio.” Em horas de decisão importante, pensa em Zé Bebelo e repete suas frases. (45)

“A diferença fundamental entre ambos, é que Riobaldo jamais desejou derrotar o sertão, acabar com os jagunços. Lutar contra os judas era diferente” (45)

“Se, mais tarde, desejou ser chefe, foi para expulsar o intruso e porque se havia convencido de que o Hermógenes já não era o sertão, mas o próprio demo com quem pactuara” (46)

“Sertão e Satanaz protegendo os judas, até que os símbolos e imagens se superpõem claramente nos combates finais: ‘Onde estava o Hermógenes? O céu botava mais nuvens. (…) O Sertão vem? Trinquei os dentes. Mordi mão de sina. (…) O Hermógenes estava para arremeter.’ ” (46)

“O sertão tinha cumprido sua parte no destino de Riobaldo. Apanhara-o, a ele, que era homem de paz e o fizera chefe de cangaço, pactário, até assassino, (46)
daquele pobre Treciziano.” (47)

” ‘O sertão me produziu, depois me engoliu, depois me cuspiu quente da boca’. Por que? O sertão não responde, não explica. Sertão é a fatalidade, o indecifrado mistério.” (47)

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(Continua, se os deuses forem bons 🙂 )

Bibliografia:

PROENÇA, Manuel Cavalcanti. (1958) Trilhas no Grande sertão. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional.