“Seja o caso (…) do jagunço Riobaldo, de Guimarães Rosa. O leitor aceita normalmente o seu pacto com o diabo, porque Grande sertão: veredas é um livro de realismo mágico, lançando antenas para um supermundo metafísico, de maneira a tornar possível o pacto, e verossímil a conduta do protagonista. Sobretudo graças à técnica do autor, que trabalha todo o enredo no sentido duma invasão do insólito, – lentamente preparada, sugerida por alusões a princípio vagas, sem conexão direta com o fato, cuja presciência vai saturando a narrativa, até eclodir como requisito de veracidade. A isto se junta a escolha do foco narrativo, – o monólogo dum homem rústico, cuja consciência serve de palco para os fatos que relata, e que os tinge com a sua própria visão, sem afinal ter certeza se o pacto ocorreu ou não. Mas o importante é que, mesmo que não tenha ocorrido, o material vai sendo organizado de modo ominoso, que torna naturais as coisas espantosas.” (77)
CANDIDO, Antonio. “A personagem de ficção” In: CANDIDO, Antonio et alii. A personagem de ficção. São Paulo: Perspectiva, 2014. p. 77.
Não houve pacto nenhum. O último parágrafo é claro: “Cerro. O senhor vê. Contei tudo. Agora estou aqui. …Amável o senhor me ouviu, minha idéia confirmou: que o Diabo não existe. … Nonada. O diabo não há! … Existe é homem humano. Travessia.