/ROSIANA 089 – O destino duplo de Riobaldo: jagunço-letrado

ROSIANA 089 – O destino duplo de Riobaldo: jagunço-letrado

‘O senhor saiba: em toda a minha vida pensei por mim, forro, sou nascido diferente. Eu sou é eu mesmo. Divêrjo de todo mundo…’

“Narrador-personagem, Riobaldo examina as linhas de seu destino duplo de jagunço-letrado.” (77)

Ao morrer a mãe e ser levado para a casa do ‘padrinho’ Selorico Mendes é que Riobaldo entra em contato com a “mitologia do cangaço”: ‘Altas artes de jagunços – isso ele amava constante – histórias’. (78)

E é o padrinho que o prepara para um destino duplo: armas e letras. Faz com que ele aprenda a atirar, a manejar porrete e faca. E também tem a ideia de mandar Riobaldo à escola. Aqui, as duas ordens se entrelaçam pois o padrinho quer que ele aprenda a ler para, entre outras coisas, inteirar-se da prova documental de que Selorico Mendes tinha relação com o famoso jagunço Neco: ‘E meu padrinho me mostrou um papel, com escrita de Neco – era recibo de seis ancorotes com pólvora (…) e a assinatura rezava assim: Manoel Tavares de Sá. Mas eu não sabia ler. Então meu padrinho teve uma decisão: me enviou para o Curralinho, para ter escola’ (78)

Riobaldo se dá bem na escola, melhor até do que na vida prática (com exceção das artes guerreiras, onde também brilha), demonstrando vocação para professor e se tornando assistente de Mestre Lucas. (78-9)

Se fora o interesse do ‘padrinho’ no cangaço que levara Riobaldo a ter contato com as letras, agora o destino se inverte: “é por ser um letrado que Riobaldo entra para o cangaço”, indo ser professor de Zé Bebelo depois de fugir da casa de Selorico Mendes. Zé Bebelo irá chamá-lo para sempre de professor, embora rapidamente aprenda tudo que Riobaldo tem a lhe ensinar. (79)

Mais uma volta do destino: na qualidade de secretário de Zé Bebelo, Riobaldo não participa mas assiste a uma batalha e foge para “não se ajagunçar”: ‘Em certo ponto do caminho, eu resolvi melhor minha vida. Fugi. De repente, eu vi que não podia mais, me governou um desgosto. Não sei se era porque eu reprovava aquilo: de se ir, com tanta maioria e largueza, matando e prendendo gente, na constante brutalidade’. (79)

Em mais uma ironia trágica, ao fugir é que vai acabar reencontrando o Menino e acabando por entrar no bando de Joca Ramiro, tornando-se de vez jagunço, embora nunca deixando de ser letrado. (79)

“Se um texto foi ponto de partida para a educação formal de Riobaldo, a qual por sua vez foi responsável por sua entrada no mundo dos jagunços, outro texto vai ser decisivo para sua promoção de jagunço a chefe. (…) Devido à sua condição privilegiada de letrado, ele é o único homem do bando a conhecer o conteúdo das cartas que Zé Bebelo envia às autoridades, quando cercado; e Riobaldo suspeita de um conluio de Zé Bebelo” (79)

É somente neste contexto de dúvida em relação à lealdade de Zé Bebelo que surge nele a ideia de liderar o bando. (80)

Bibliografia:

GALVÃO, Walnice Nogueira.
(1972) As formas do falso. Um estudo sobre a ambiguidade no Grande Sertão: Veredas. São Paulo: Editora Perspectiva.