O primeiro nome dele era Albert, pois era comum entre famílias nigerianas da primeira metade do século XX nomearem seus filhos de forma mista: o nome africano vinha em segundo lugar. Os pais de Chinua Achebe, nascido em 1930, representavam bem esse processo. Conheciam muito bem a tradição do povo Igbo, mas haviam se convertido à religião protestante. Em casa, a mãe contava histórias da tradição oral enquanto o pai apresentava os filhos a Shakespeare. Chinua Achebe foi para uma escola de língua inglesa e logo se destacou pela inteligência. Na universidade, mergulhou no estudo dos clássicos ocidentais, mas logo notou dois problemas. O primeiro era a forma como os africanos em geral eram representados, como selvagens ou até como sub-humanos, algo que ele observou até mesmo em livros que tentaram denunciar o imperialismo como O Coração das Trevas, de Joseph Conrad. A segunda questão era ainda mais grave: havia o que ele chamou de “lacuna na prateleira”, simplesmente não existiam livros de ficção escritos por africanos. Estes eram sempre vistos de fora, pelo olhar do colonizador branco, de acordo com a vasta ignorância do escritor “civilizado”, quando não de acordo com seus preconceitos e seu racismo.
É assim que ele se dedica a escrever aquela que é considerada a pedra fundamental da literatura africana: O mundo se despedaça, publicado em 1958. Quase que o manuscrito foi perdido: o autor enviou o original escrito à mão – do qual ele não tinha nenhuma cópia, para uma editora em Londres, que não somente guardou os papéis na gaveta mas não se dignou a responder aos pedidos de notícias. Chinua, que trabalhava na BBC da Nigéria, consegue que sua chefe resgate aquilo que viria a se tornar um clássico traduzido em mais de setenta línguas.
O poder deste livro se deve, inicialmente, à profundidade com que descreve os costumes tribais dos Igbo na primeira parte, o que contrasta dramaticamente com a rápida e desorientadora transformação dos costumes, ligada entre outras coisas à chegada da religião cristã. Em segundo lugar, a personagem central, Okwonkwo, encarna à perfeição o ideal dos costumes tradicionais e a sua trajetória representa muito bem o processo de mudança e o seu impacto.
Por um lado, os traços culturais são descritos de dentro, segundo sua lógica própria, distantes de uma etnografia feita por um estrangeiro. Para quem imagina uma África simples, primitiva, o livro apresenta, tratando de uma única etnia, uma riqueza cultural extraordinária. Ao mesmo tempo, da mesma forma que em seu nome, Chinua Achebe também tem seu lado Albert: ele introduz uma fina observação da psicologia dos personagens na melhor tradição do romance ocidental.
Além de todos esses elementos, há ainda aquele, indispensável mas de difícil definição, a não ser pela batida imagem de que é um livro tão bem escrito que temos vontade de parar a vida e o mundo para que possamos lê-lo de uma só vez.