/UM NOVO VÍRUS NA PRAÇA

UM NOVO VÍRUS NA PRAÇA

Doutor Cardoso não conseguiria atender seus pacientes sem a ajuda da enfermeira Maria que por sua vez não  chegaria ao hospital sem ser transportada no  ônibus dirigido por João, que não pilotaria se não tivesse comido  os pãezinhos feitos na padaria por Severino, que não os faria se não tivesse sido ensinado por Seu Manuel, que se não tivesse saído de Portugal…

e por aí vai…

Talvez esse cvírus da pesada faça o mundo se ligar para o fato de que o planeta todo está interligado, as nossas ações repercutem sobre os outros e vice-versa.

Por vários motivos vivemos um momento de intensa separação e confronto. Temos a divisão esquerda x direita, que ultimamente se acirrou e virou UFC nas arenas virtuais. Temos os excessos das políticas identitárias que valorizam o mesmo em oposição ao  outro sem perceber que estão construindo o próprio  isolamento. E, por fim, temos a maior mentira de todas, pilar do liberalismo e do neo-liberalismo, a ideia de indivíduo. Temos carteira de identidade, nossa vida, nossos planos, nos pensamos independentes e únicos, postamos mil e uma selfies no Instagram para provar que estivemos aqui e ali, fizemos isso ou aquilo, somos bonitos, fortes etc etc.

Ora, nós não conseguimos sequer expressar nossos pensamentos sem a utilização de uma ferramenta coletiva, construída ao longo da história da sociedade, chamada língua. Quem fala uma língua toda, mas toda própria, fala algo ininteligível, que ninguém compreende. Quem só pensa em si, por definição, é alguém que só pensa sobre o mesmo: to idion, em bom português, um idiota.

Quem sabe o cvírus, jogando por terra essa ilusão de auto-suficiência, de independência total, de individualismo, quem sabe essa doença possa nos ajudar a inocular um novo  vírus na praça: o vírus da consciência universal, da humanidade à qual todos pertencemos independentemente dos rótulos da nossa escolha.