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HOBSBAWM – O que os historiadores ganham com o estudo da invenção das tradições

O que os historiadores ganham com o estudo da invenção das tradições

  1. as tradições inventadas são sintomas, indícios importantes, indicadores de problemas e transformações dificilmente detectáveis de outra forma

p.ex:

  • Pode-se elucidar melhor como o antigo nacionalismo liberal alemão assumiu sua nova forma imperialista-expansionista observando-se a rápida substituição das antigas cores preta, branca e dourada plas novas cores preta, branca e vermelha (principalmente na década de 1890) no movimento da ginástica alemã, do que estudando-se as declarações oficiais de autoridades ou porta-vozes.”

  • Pela história das finais do campeonato britânico de futebol podem-se obter dados sobre o desenvolvimento de uma cultura urbana operária que não se conseguiram através de fontes mais convencionais.”

Alerta: “o estudo das tradições inventadas não pode ser separado do contexto mais amplo da história da sociedade, e só avançará para além da simples descoberta destas práticas se estiver integrado a um estudo mais amplo.”

  1. o estudo dessas tradições esclarece bastante as relações humanas com o passado e, por conseguinte, o próprio assunto e ofício do historiador. Isso porque toda tradição inventada, na medida do possível, utiliza a história como legitimadora das ações e como cimento da coesão grupal.”

(…)

todos os historiadores, sejam quais forem os seus objetivos, estão envolvidos nesse processo, uma vez que eles contribuem, conscientemente ou não, para a criação, demolição e reestruturação de imagens do passado que pertencem não só ao mundo da investigação especializada, mas também à esfera pública onde o homem atua como ser político. Eles devem estar atentos a esta dimensão de suas atividades.”

  1. Interesse específico do estudo das tradições inventadas no caso da história moderna e contemporânea: “Elas são altamente aplicáveis no caso de uma inovação histórica comparativamente recente, a ‘nação’ e seus fenômenos associados: o nacionalismo, o Estado nacional, os símbolos nacionais, as interpretações históricas e daí por diante. Todos estes elementos baseiam-se em exercícios de engenharia social muitas vezes deliberados e sempre inovadores, pelo menos porque a originalidade histórica implica inovação.”

Exs:  nacionalismo e nações israelita e palestina são novos, pois a idéia disso só veio a existir depois da I GM, “seja qual for a continuidade histórica dos judeus ou dos muçulmanos no Oriente Médio

As linguagens-padrão nacionais, que devem ser aprendidas nas escolas e utilizadas na escrita, quanto mais na fala, por uma elite de dimensões irrisórias, são, em grande parte, construções relativamente recentes.”

O paradoxo das nações modernas:

com toda a sua parafernália, geralmente

afirmam ser o oposto do novo, ou seja estar enraizadas na mais remota antiguidade,

e o oposto do construído, ou seja, ser nas comunidades humanas, ‘naturais’ o bastante para não necessitarem de definições que não a defesa dos próprios interesses.”

(…)

E é exatamente porque grande parte dos constituintes subjetivos da ‘nação’ moderna consiste de tais construções, estando associada a símbolos adequados e, em geral, bastante recentes ou a um discurso elaborado a propósito (tal como o da ‘história nacional’), que o fenômeno nacional não pode ser adequadamente investigado sem dar-se atenção devida à ‘invenção das tradições’.”

  1. o estudo da invenção das tradições é interdisciplinar. É um campo comum a historiadores, antropólogos sociais e vários outros estudiosos das ciências humanas, e que não pode ser adequadamente investigado sem tal colaboração.”

    In: HOBSBAWM,E. & RANGER,T. (Orgs.) A invenção das tradições. Rio de Janeiro:Paz e Terra,1984. pp. 20-22.