/ARTE – MIRE E VEJA – RUA DE PARIS, DIA CHUVOSO (1877), Gustave Caillebotte (1848-1894)

ARTE – MIRE E VEJA – RUA DE PARIS, DIA CHUVOSO (1877), Gustave Caillebotte (1848-1894)

MIRE E VEJA

RUA DE PARIS, DIA CHUVOSO (1877), Gustave Caillebotte (1848-1894)

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Óleo sobre tela, 212 x 276 cm, The Art Institute of Chicago

Curiosamente, o autor desta tela jamais vendeu um quadro em vida. Não precisava, herdara uma fortuna e era o principal mecenas dos pintores impressionistas à época em que eram outsiders no mundo artístico. Gustave Caillebotte era amigo de Renoir, Degas, Monet, Pissarro e outros. Somente de Monet ele comprou dezoito obras. Mas além de apoiá-los financeiramente, também pintava ele mesmo, entre outras coisas, paisagens urbanas em grande formato como o quadro aqui colocado.

Este representa uma grande interseção de vias urbanas na Paris recém-renovada após a longa reforma do prefeito Haussmann (1853-1870), que o escritor Émile Zola chamou de “uma poderosa máquina que escavou Paris por quinze anos, fazendo fortunas e falências”. Veio abaixo a cidade medieval de ruas estreitas e nasceu a Paris que conhecemos hoje, com suas largas avenidas e boulevares. Hoje em dia o local se chama Place de Dublin e fica perto da Gare Saint-Lazare.

É um dia de inverno, frio e chuvoso. As fachadas dos prédios ostentam a grandeza e a simetria que Haussmann havia projetado e implementado com uma série de regulamentos, como o número máximo de andares por distrito. A composição do quadro é dividida em duas partes por um lampião a gás, outro elemento da modernidade urbana. Mas o quadro não celebra os novos tempos. Todos parecem estar apenas de passagem, apressados, sem usufruírem com prazer do novo espaço. Ademais, em sua maioria estão sós, usando os guarda-chuvas para se proteger do tempo mas ao que parece como escudos uns contra os outros. Ninguém está conversando, nem mesmo o casal que aparece em destaque, que olha para o lado evitando o contato visual com o homem que aparece na extremidade direita da tela. É como se ele dissesse que a cidade ganhou luxo e refinamento, mas perdeu a alma.

Um outro elemento nos ajuda a pensar que este quadro contenha uma crítica à “Nova Paris”. Aparecem nele, em destaque os paralelepípedos que formam o piso das ruas. Ora, os paralelepípedos foram a principal arma dos revoltosos da Comuna de Paris (1871) poucos anos antes. E eles haviam combatido bem perto dali, na Place de Clichy. Victor Hugo chegou a chamar o paralelepído de “o símbolo do povo”. E os lampiões a gás, como o que aparece no quadro, também haviam sido derrubados durante a revolta.

Em termos de capacidade crítica, nada mau para um filho da alta burguesia…

P.S: Mostrando que era mesmo bacana, Caillebotte deixou no seu testamento 40 quadros impressionistas doados ao governo francês para com eles iniciar um museu (não aceitava que fossem exibidos de qualquer maneira). Humildemente, não incluíu nenhum quadro seu, injustiça que foi reparada por seu amigo Renoir.