“Um [Freud] teve uma vida 32 anos mais longa do que o outro, tendo nascido quinze anos antes e morrido dezessete anos depois. Um pouco saiu do ambiente vienense depois de uma temporada parisiense; o outro [Proust] pouco deixou o meio parisiense. Nenhum dos dois (a ênfase se faz necessária porque a questão sempre aparece*) leu o outro, apesar de Freud falar francês perfeitamente e Proust ter estudado no liceu Condorcet. Em contrapartida, o doutor Adrien Proust, pai de Marcel, assistiu às aulas de Charcot no Hospital da Salpêtrière, assim como Freud. Pertenciam à mesma escola médica de pensamento. Podemos afirmar, portanto, que Freud, estudante em Paris, e Proust, na própria casa, beberam da mesma fonte científica e médica. Quanto à cultura judaica, ela aparece em O homem Moisés e a religião monoteísta, nas primeiras linhas de Um estudo autobiográfico e em inúmeras citações de Em busca do tempo perdido: nenhum dos dois homens era religioso, um desconstruiu ironicamente a figura de Moisés, um egípcio; o outro fazia alusões bíblicas a título de zombaria.”

TADIÉ, Jean-Yves. O lago desconhecido: Entre Proust e Freud. Porto Alegre: L&PM, 2017. p. 11.