“‘O inconsciente de Shakespeare’, diz Freud, ‘permitiu-lhe compreender o inconsciente de seu herói’, depois que um acontecimento real, acredita ele, levou-o a escrever o drama de Hamlet. Note-se, porém, que o sonho de Swann não pode ser um sonho exato de Proust, porque está cheio de elementos romanescos e personagens que sabemos pertencer ao romance (caso contrário, seria preciso supor, o que é pouco provável, que Proust sonha com seu romance, seus personagens, seu fim) e porque não podemos descrever o inconsciente de Swann como se fosse o de Proust, embora Proust destaque certos gestos de Swann como inconscientes: alguns heróis de romance podem ser imaginados com seus próprios inconscientes, como Zeno, o herói de Ítalo Svevo, aliás muito próximo do autor, que narra seus conflitos com a psicanálise; não é o caso aqui.”
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TADIÉ, Jean-Yves. O lago desconhecido: Entre Proust e Freud. Porto Alegre: L&PM, 2017. p.33.