/PORTELLI – O ex-escravo F. Douglass e a contradição entre a escravidão e a natureza humana

PORTELLI – O ex-escravo F. Douglass e a contradição entre a escravidão e a natureza humana

Douglass e a contradição entre a escravidão e a natureza humana

Quando F.Douglass descreve o desprazer do Sr. Hopkins em exercer a tarefa de overseer (feitor), isto é aponta a contradição entre a escravidão e a natureza humana

“tanto nos discursos orais como nas diferentes redações de sua autobiografia [F.D.] insiste em falar por si mesmo, em interpretar e julgar-se a si mesmo e aos demais, entrelaçando continuamente os fatos com a análise da subjetividade. (…) ex. quando frisa que o overseer James Hopkins era diferente dos outros, que só usava o chicote “com muito asco”

comenta Portelli:

o fato importante não é o que o senhor Hopkins fazia, mas seu estado de ânimo, sua subjetividade. (…) Douglass trata de nos fazer compreender que a chicotada estabelece também uma relação política: graças a ela a subjetividade do vigilante deixa o sinal na subjetividade do escravo, e vice-versa. O desprazer do senhor Hopkins se converte, então, para Douglass, num sinal evidente da contradição entre a escravidão e a natureza humana: nem sequer o vigilante pode se negar, no fundo, a reconhecer a humanidade dos que golpeia, do mesmo modo que a sua própria.”

(páginas 61-62)

PORTELLI, Alessandro. “A filosofia e os fatos: narração, interpretação e significado nas memórias e nas fontes orais”. Tempo 2, Revista do Departamento de História, Rio de Janeiro, dez. 1996.