“O desafio lançado à história pelas novas disciplinas [e.g. linguística, sociologia, psicologia] assumiu diversas formas, umas estruturalistas, outras não, mas que no conjunto puseram em causa seus objetos – desviando a atenção das hierarquias para as relações, das posições para as representações – e as suas certezas metodológicas – consideradas mal fundadas quando confrontadas com as novas exigências teóricas. (…)
A resposta dos historiadores foi dupla. Puseram em prática uma estratégia de captação, colocando-se nas primeiras linhas desbravadas por outros. Daí a emergência de novos objetos no seio das questões históricas: as atitudes perante a vida e a morte, as crenças e os comportamentos religiosos, os sistemas de parentesco e as relações familiares, os rituais, as formas de sociabilidade, as modalidades de funcionamento escolar, etc. – o que representava a constituição de novos territórios do historiador através da anexação dos territórios dos outros. Daí, corolariamente, o retorno a uma das inspirações fundadoras dos primeiros Annales dos anos 30, a saber, o estudo das utensilagens mentais que o domínio de uma história dirigida antes de mais para o social tinha em certa medida relegado para segundo plano. Sob a designação de história das mentalidades ou de psicologia histórica delimitava-se um novo campo, distinto tanto da antiga história intelectual como da hegemônica história econômica e social.”
CHARTIER,R. [1990] A História Cultural – entre práticas e representações. Lisboa:Difel. páginas 14-15