/ESTUDOS PROUSTIANOS – A importância do odor, a sensibilidade especial de Proust a ele:

ESTUDOS PROUSTIANOS – A importância do odor, a sensibilidade especial de Proust a ele:

Em vista da tenacidade especial com que as reminiscências são preservadas no olfato (o que não é de nenhum modo idêntico à preservação dos odores na reminiscência), não podemos considerar acidental a sensibilidade de Proust aos odores. Sem dúvida, a maioria das recordações que buscamos aparecem à nossa frente sob a forma de imagens visuais. Mesmo as formações espontâneas da mémoire involontaire são imagens visuais ainda em grande parte isoladas, apesar do caráter enigmático de sua presença. Mas por isso mesmo, se quisermos captar com pleno conhecimmento de causa a vibração mais íntima dessa literatura, temos que mergulhar numa camada especial, a mais profunda, dessa memória involuntária, na qual os momentos da reminiscência, não mais isoladamente, com imagens, mas informes, não-visuais, indefinidos e densos, anunciam-nos um todo, como o peso da rede anuncia sua presa ao pescador. O odor é o sentido do peso, para quem lança sua rede no oceano do temps perdu. E suas frases são o jogo muscular do corpo inteligível, contêm todo o esforço, indizível, para erguer o que foi capturado.”
Walter Benjamin, “A imagem de Proust” In: Obras escolhidas – volume 1: Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1987. 3. ed. pp. 48-49.