OS SETE SEGREDOS DE FLORA
Capítulo 48: JAGUNÇO
— Pedro, a Flora estava colocando a mão em casa de marimbondo. E isso é o diário do primeiro ano, do início da pesquisa. Imagina o que ela não descobriu depois, quando passou a medir a destruição feita pela Zerdau. Manda brasa, continua a ler …
Com a cabeça pesada depois de ouvir as revelações de Seu Zé, lembrei que não havia almoçado e já era noite. Fui até o único lugar onde se podia comer uma refeição por ali, o bar da Carmem. É um lugar bem rústico. Funciona como tudo no interior: é botequim, armarinho, padaria e restaurante de vez em quando. No balcão, uma garrafa de cachaça gigante. Tinha que encomendar o jantar com uma hora de antecedência. Ela disse que seria uma comidinha caseira. Passei na casa de Dona Olga, tomei um banho rápido e fiz anotações no computador, diário de campo é que nem pão, quente é muito melhor. Quando voltei, Carmem tinha preparado um banquete, sobretudo se comparado ao meu apetite, que não era tanto. Generosas porções de arroz e feijão, farofa, uma salada simples, costeleta de porco e batata frita. Não sei como ela faz para a batata ficar tão crocante. Tudo estava muito bem temperado e saboroso. Só não esperava que ela me revelasse tanta coisa na conversa. Disse que tinha sido casada durante 15 anos com um “homem da Zerdau”, um funcionário sem carteira assinada, encarregado de fazer o “serviço sujo”:
— Desde quando assinam a carteira de jagunço? O que eu sei é que lá em casa não faltava nenhum tipo de arma, eram armários com pistolas e revólveres, fuzil, escopeta, era um arsenal de guerra sem tamanho. E quando ele não estava fora de casa metendo medo ou bala nos outros, aproveitava toda ocasião que tinha para me bater. Eu era bonita, sabe? Se eu tentasse fugir, cortaria minha cara todinha, mataria meus pais.
— Agora a senhora está separada?
— Dei sorte, ele se enrabichou por uma mulherzinha vinte anos mais nova do que eu, uma menina. Foi só aí que largou de mim. A casa que a gente construiu com o trabalho dos dois ficou só para ele. Mal e mal consegui uma pensão para as minhas duas filhas. Tive que abrir esse comércio aqui para poder sobreviver, para dar de comer a elas.