OS SETE SEGREDOS DE FLORA

Capítulo 57: RIACHINHO SECO

17 de setembro de 2018

Ainda estava em Andrequicé quando chegaram as equipes de reportagem de O Tempo e de O Estado de Minas. Assisti e por não confiar filmei com o celular alguns depoimentos.

— O que houve com a sua roça Dona Josefa?

— Moço, vivo aqui desde que casei aos dezesseis anos com esse Libório que está aqui do meu lado. Sempre plantamos nosso feijão, nosso milho, um tiquinho de abóbora. O riacho que corta nosso pedaço de terra era nosso maior amigo. Vinha dele a água pra beber, pra lavar e pra irrigar nossos cultivos quando a seca piora.

— E agora?

— Uma tristeza, seu moço, o riachim tá mais seco que pedra debaixo de sol. Tudo morreu, não se salvou nada. Como é que a gente vai viver?

— Como isso aconteceu?

— Não tenho os estudos pra dizer. Mas depois que começaram a plantar eucalipto por toda a parte a água desapareceu.

— Então é culpa da Zerdau?

— Uai, de quem mais? Mas nem fala esse nome… os homens dela não são de brincadeira. Mas agora nós vamos enfrentar esses desgraçados.

Enquanto falava, a senhora apertava uma mão na outra e vez por outra olhava para o seu Libório.

Se o Pedro visse o povo se revoltando ficaria feliz.

Muita gente conversou com os jornalistas, nada faltava para uma grande reportagem. Antes do almoço fui embora para ficar um dia em BH. Precisava completar a parte histórica da pesquisa no Arquivo Público Mineiro. Queria fazer um levantamento do processo de ocupação das terras do sertão. Antes tinha sido o que Riobaldo descreve: “é onde os pastos carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de morador;”. Agora, os cantões mais distantes e desertos estavam delimitados com arame farpado e placas identificando o proprietário. Terras ocupadas por bois e eucalipto em vez de gente. Consegui documentos e fui relaxar na Praça da Liberdade, ali perto. Ela está para Minas Gerais assim como a Acrópole estava para Atenas, é um lugar de honra. Por isso fiquei tão chocada quando vi que em um dos mais imponentes prédios em torno da praça havia um museu bancado e com o nome da Zerdau. Não é nenhuma novidade: há mais de 500 anos que os donos da terra são os donos de tudo.