/OS SETE SEGREDOS DE FLORA – Capítulo 56: RESISTÊNCIA

OS SETE SEGREDOS DE FLORA – Capítulo 56: RESISTÊNCIA

OS SETE SEGREDOS DE FLORA

Capítulo 56: RESISTÊNCIA

16 de setembro de 2018

Desde pequena gosto de voltar pelo mesmo caminho. Dirigi de Grão-Mogol a Andrequicé no primeiro dia do meu retorno. Saí às quatro da manhã pensando em escapar do homem dos cabelos ridículos. Nada adiantou, lá estava o Tucson prateado e o sujeito com seu sorriso sádico. Fiz de conta que não vi e tomei a estrada, descendo o caminho cheio de curvas que iria me levar a Montes Claros e depois a Andrequicé. O homenzinho estava querendo se divertir. Me seguiu de perto, me ultrapassou e deu uma fechada que jogou o Zorba no acostamento. Estava dizendo: — Se eu quisesse poderia te matar, dona. Antes de Montes Claros, deu meia-volta na pista cantando pneu e me vi livre dele para sempre, amém.

Cheguei a Andrequicé na hora do almoço, o que seria muito bem vindo depois de mais de seis horas ao volante. Não esperava encontrar o que encontrei. A cidade estava cheia de faixas contra a Zerdau:

“Zerdau, tire as patas do Cerrado”

“Zerdau assassina dos nossos rios”

“Lute contra a Zerdau ou morra de sede”

O bar da Carmem era o quartel-general da resistência à companhia. Mais agitada do que de costume, ela me explicou:

— Cansamos de ser capacho da Zerdau. Há um mês que só temos água de caminhão-pipa, no campo nossas criações tão morrendo. A Zerdau tem bombas d’água, nunca ninguém viu plantação de eucalipto secar. O povo se revoltou. Quebramos duas carvoarias deles, tentamos incendiar um eucaliptal mas fomos recebidos a bala pela jagunçada da companhia. Decidimos em assembléia que não vamos deixar que nenhum empregado deles bote o pé aqui. Não vamos servir café, nem almoço, nem jantar, não vamos dar bom dia nem boa noite. Ninguém vai hospedar os pilotos dos aviões que jogam inseticida pra poluir nossas águas nem os homens que vêm cuidar do eucalipto. Mulher daqui que sair com peão da companhia vai apanhar e homem também se for o caso. Fotografamos tudo e mandamos para os jornais de Belo Horizonte, amanhã vão aparecer aqui para uma grande reportagem.

Gravei entrevistas e tirei fotos. Era o que faltava para o meu dossiê cair como uma bomba na CPI. Vamos acabar com a Zerdau. Estou louca para chegar em casa e agarrar o Pedro.