OS LAÇOS DE HOSPITALIDADE – DOM E CONTRA-DOM
Natureza e data do texto:
Dois heróis homéricos estão prestes a confrontar-se, quando um deles, o argivo Diomedes, pede a seu adversário que decline “de que estirpe mortal te originas”. Este, o lício Glauco, o faz em grande estilo (Ilíada, VI, 145-211) e os dois acabam por reconhecer que estavam ligados por laços de hospitalidade, imediatemente procedendo ao ‘ritual’ do dom e contra-dom.
“Esse o meu sangue, essa a estirpe, que só de nomear envaideço
Isso disse ele [Glauco] ; alegrou-se Diomedes, de voz retumbante;
finca a hasta brônzea na terra, de heróis a nutriz generosa,
e, com palavras afáveis, saudou o pastor de guerreiros:
‘Hóspede és meu desde o tempo de nossos avós, vejo-o agora.
(…)
Por essa antiga amizade, és meu hóspede em Argos, ao passo
que me farás grato hospício se um dia eu chegar até à Lícia.
Cumpre, portanto, que em meio da pugna, um ao outro poupemos.
(…)
Ora troquemos as armas, porque possam todos os outros
reconhecer que nós dois nos gloriamos da avita amizade’.
Ambos, dos carros desceram, depois de assim terem falado,
e, logo, apertos de mão como prova de afeto trocaram.
Foi quando o crônida Zeus o juizo de Glauco conturba,
por ter querido trocar com Diomedes as armas que tinha
ouro por bronze, o valor de cem bois pelo preço de nove.”
(Ilíada, VI, 211-215; 224-226;23–236)