PEDRO E FLORA: UMA HISTÓRIA DE AMOR?
Capítulo 16: MARCAS INVISÍVEIS
Mauricio e Pedro só poderiam viajar para Itaipava em busca do doutor Cardoso na tarde de sexta. Bola iria trabalhar no escritório montando o projeto de casas populares. E Pedro tinha que trabalhar. Era ainda terça-feira, o tempo era um elefante preguiçoso. A aula do dia era sobre a urbanização. A turma de adolescentes gostava do professor, da sua fala apaixonada, não importando o assunto. Parecia que era sempre a questão mais importante do mundo e que cabia a eles resolver os problemas que Pedro apresentava. Ele estimulava a participação com perguntas frequentes e pedia trabalhos criativos, trazia passagens da literatura, propunha situações. Concluiu sua aula propondo uma reflexão:
— O Brasil é louco. Em 1950, era um país rural, mais de 60% da população vivia no campo, apenas 40% nas cidades. Em trinta anos, vejam bem, em apenas trinta anos era o inverso. Em 1980, 60% da população vivia nas cidades, sobretudo nas grandes cidades, e apenas 40% no campo. Será que vocês conseguem imaginar o que isso representou para milhões de pessoas que vieram do campo, de áreas sem eletricidade, sem escola, hospital, sem água encanada ou esgoto? E o impacto que isso teve na já precária infra-estrutura urbana? O exercício para a aula que vem: imaginar que você é um migrante vindo do campo e chegando na cidade. Vocês escolhem se serão um dos pais ou uma criança. Os motivos para migrar são por conta de vocês. Como eles foram recebidos na cidade? O que pensaram ao chegar? Que dificuldades tiveram? Apenas uma página. Vamos ler e debater cada um dos trabalhos. Tocou o sinal. Ele viu a turma desaparecer que nem água escoando na banheira.
Aula terminada, vinha a parte mais difícil, voltar para casa. Bola tinha arrancado e guardado os bilhetes e fotos, para Pedro não enlouquecer. Mas as marcas invisíveis estavam em toda a parte. Sua casa era uma armadilha. Ao entrar, lembrou que certa vez entreabriu a porta e disse que não iria deixá-la entrar:
— É beleza demais, não vai caber em um apartamento tão pequeno.
Nos olhos de Flora, havia um amor tão grande que o coração de Pedro era o único lugar em que ele poderia se abrigar.