TRÊS MÚSICAS DE PROTESTO PRÉ E PÓS GOLPE DE 64
Opinião (1963) – Em meio ao início do processo de retirada forçada dos moradores de favelas, Zé Kéti denuncia o abandono e aponta a disposição em resistir; líderes comunitários de favelas seriam presos e mortos e a Ditadura Militar aprofundaria o processo de expulsão dos moradores de favelas, sobretudo da Zona Sul, enviando-os para conjuntos habitacionais distantes e sem infraestrutura (como Cidade de Deus, por exemplo).
Zé Kéti
Podem me prender
Podem me bater
Podem até
Deixar-me sem comer
que eu não mudo de opinião
eu não saio não.
Se não tem água
eu furo um poço
Se não tem carne
eu pego um osso
e ponho na sopa
e deixa andar
fale de mim
aqui do morro
quem quiser falar
aqui eu não pago aluguel
se eu morrer amanhã, seu doutor
estou pertinho do céu
Funeral de um lavrador (1965) – poema de João Cabral de Melo Neto, de 1954, musicado por Chico Buarque; é preciso lembrar que a reforma agrária foi um dos principais pontos de discórdia que levaram à articulação da reação conservadora que desembocou no golpe militar.
Esta cova em que estás,
Em palmos medida,
É a conta menor que tiraste em vida,
É de bom tamanho,
nem largo nem fundo,
É a parte que te cabe neste latifúndio,
Não é cova grande,
é cova medida,
É a terra que querias ver dividida,
É uma cova grande,
para teu corpo defunto,
mas estarás mais ancho do que estavas no mundo,
é uma cova grande para teu defunto parco,
Porém mais que no mundo te sentirás largo,
É uma cova grande,
para tua carne pouca,
Mas a terra dada não se abre a boca.
Acender as velas (1965) – novamente Zé Kéti, em mais uma denúncia das péssimas condições de vida dos moradores das favelas, abandonados pelo poder público.
Zé Kéti
Acender as velas já é profissão,
Quando não tem samba tem desilusão,
É mais um coração que deixa de bater,
Um anjo vai pro Céu,
Deus me perdoe,
Mas vou dizer,
O doutor chegou tarde demais
Porque no morro não tem automóvel
para subir
não tem telefone para chamar
não tem beleza para se ver
e a gente morre sem querer morrer.