/A educação dos espartanos

A educação dos espartanos

A EDUCAÇÃO DOS ESPARTANOS

Natureza e data do texto:

Trecho da Politeia [Constituição] dos Espartanos, de Xenofonte (c. 430- c.355). Como era comum entre os nascidos de família abastada, Xenofonte não era um amante da democracia ateniense. Em 401 juntou-se a uma força mercenária contratada pelo persa Cyrus para ajudar a tomar o trono da Pérsia, o que não ocorre. Xenofonte lidera a retirada dos mercenários gregos – conhecida como a ‘retirada dos dez mil’ e retratada por ele na Anábase – com grande coragem e habilidade. Acaba por se tornar amigo do rei espartano Agesilau, passando a lutar ao lado dos espartanos, na Pérsia e mesmo na Grécia, talvez contra os próprios atenienses. Estes decretam seu exílio e ele passa a viver na Élida em uma propriedade que lhe foi dada pelos espartanos e onde Xenofonte passou vinte anos como um grande proprietário, caçando e escrevendo suas obras. Em 370, devido a um levante dos elidenses, foi para Corinto. Seu exílio de Atenas foi revogado em 365 mas é duvidoso que ele tenha regressado a sua cidade natal antes da sua morte em 365.

“Ao invés de deixar que cada homem escolha um paidagogos próprio para os seus filhos, Lycurgus colocou todas as crianças sob a responsabilidade de um homem escolhido dentre os da classe que controlam as principais magistraturas; ele é chamado paidonomos e Lycurgus deu a ele autoridade para reunir os garotos, inspecioná-los e punir qualquer falta severamente. Este magistrado dispunha também de um grupo de jovens rapazes portando chicotes para punições quando necessário; daí resultam grande respeito e obediência. Ao invés de amaciar seus pés com sapatos, Lycurgus decretou que eles deveriam fortalecê-los andando descalços; ele acreditava que, caso este fosse o seu hábito, eles escalariam mais facilmente, desceriam morro abaixo com maior segurança e que um homem poderia saltar, pular e correr mais rapidamente descalço do que usando sapatos, desde que seus pés estivessem acostumados a isso.

Ao invés de mimá-los quanto às vestimentas, ele decretou que eles deviam usar a mesma peça de roupa durante todo o ano, para que eles tolerassem melhor calor e frio. Ele estabeleceu a ração de cada irene de tal forma que ninguém seria prejudicado por comer demais ou deixaria de às vezes experimentar alguma fome. Ele pensava que aqueles criados sob tal regime suportariam melhor trabalhar sem comida caso a situação exigisse, e manter-se-iam com a mesma ração por mais tempo caso isto lhes fosse ordenado; eles sentiriam menos falta de delícias, seriam de uma maneira geral menos interessados em comida e teriam uma vida mais saudável. Ele pensava que o tipo de alimentação que os deixava mais magros tendia também a torná-los mais altos, ao contrário daquele que produz gordura. Para evitar que eles fossem perturbados demais pela fome, embora não lhes permitisse pegar o que quisessem sem problemas, ele permitia que roubassem algo para aliviar sua fome.

(…)

Está claro que ele incluiu este elemento na sua educação para tornar os garotos cheios de expedientes para obter o necessário à vida, e mais preparados para a guerra.

(…)

Para evitar que as crianças ficassem sem controle quando o paidonomos os deixava, Lycurgos estabeleceu que qualquer cidadão então presente poderia dar aos garotos quaisquer instruções que se fizessem necessárias, além de punir qualquer má conduta. Através destes meios ele produziu mais respeito entre os garotos; de fato, tanto adultos quanto garotos têm supremo respeito por aquele que os comanda. De maneira a haver sempre alguém no comando mesmo quando não havia nenhum adulto presente, ele designou o melhor entre os irenes para tomar conta de cada companhia; deste modo, os garotos em Esparta nunca estão sem alguém a controlá-los.”

XENOFONTE, Politeia dos Espartanos, II, 2-11.

FONTE: MOORE,J.M. Aristotle and Xenophon on democracy and oligarchy. Londres: Chatto & Windus, 1983. pp. 76-78.