/HISTÓRIAS DO SAMBA – 35. A humildade é a chave

HISTÓRIAS DO SAMBA – 35. A humildade é a chave

  1. A humildade é a chave

 

Certa vez lá estava Noel bebendo no Café Nice em uma roda de amigos compositores. Eis que se aproxima um rapaz negro, com cerca de 20 anos. Muito humildemente, pergunta por Seu Noel Rosa. Noel logo se apresenta. O rapaz explica que viera até ali para propor uma parceria: ele havia feito a primeira parte de um samba e gostaria que Noel fizesse a segunda parte.

Os amigos de Noel seguram as risadas, achando ridículo que um anônimo tivesse a ousadia de fazer uma proposta daquelas. Talvez tivessem esquecido da letra de João Ninguém, feita por Noel:

 

João Ninguém
Não tem ideal na vida
Além de casa e comida
Tem seus amores também
E muita gente que ostenta luxo e vaidade
Não goza a felicidade
Que goza João Ninguém!

 

O fato é que Noel, surpreendentemente, pede ao rapaz que cante a primeira parte. Assim que ele termina, Noel pega papel e lápis e faz vários versos para seu novo parceiro. O moço ainda reclama, porque Noel havia feito versos demais, fazendo com que o jovem ficasse em dúvida quanto a quais colocar como segunda parte no seu samba.

Noel não fica zangado, pelo contrário, acha graça e diz com toda a generosidade do mundo: tudo bem companheiro, então faça mais uns sambas para usar estes versos extras. Este profundo respeito pelas pessoas humildes e pela cultura popular é que explicam como Noel, garoto branco e de classe média, conseguiu tornar-se um dos maiores cronistas da vida cotidiana das classes pobres no Rio de Janeiro.