- Diamante
Foi na Lemos Britto que conheci “Seu Gonzaga”. Preso com mais de “vinte anos de praia” como ele dizia com fina ironia, ele era um negro esguio, muito educado e diplomata, típico “bom malandro”. Já fora “dono de morro” e amargara a traição do seu pessoal, que parara de enviar dinheiro para ele na cadeia. Ele levava na esportiva e estava sempre sorrindo. Na cadeia ele era uma lenda: todos diziam que ele tinha um baú de composições que guardava a sete-chaves.
Seu Gonzaga tinha tanto medo de que lhe roubassem seu único tesouro que muitas vezes compunha os versos das músicas sob a forma do acróstico, com as iniciais formando o nome de um parente dele, uma espécie de impressão digital que marcava a composição como sua. Nos poucos meses em que frequentei a Lemos, acabamos ficando amigos. Seu Gonzaga estava prestes a “ganhar liberdade”.
Quando finalmente saiu, ele me procurou. A primeira coisa que me pediu foi que passasse a chamá-lo de Diamante, o nome artístico que simbolizava sua nova vida. Como prova de confiança, deu-me uma fita com algumas de suas composições. Ali havia sambas belíssimos, de estilo variado, desde clássicos samba-canção até sambas suingados que lembravam Jorge Ben. E ele passeava também por outros gêneros musicais.
Enfim, era mesmo um Diamante nada bruto que precisava apenas de uma chance. Infelizmente não consegui ajudá-lo a encaminhar suas músicas. Apesar das ofertas do mundo do crime, Diamante nunca mais traiu sua alma de compositor, por vezes dormiu na rua e preferiu trabalhar de camelô no centro da cidade, esperando a hora de ser reconhecido como artista. Essa hora nunca chegou, mas ele não morreu bandido, ele morreu Diamante.