MATERIAIS PARA A SALA DE AULA # 007
DITADURA MILITAR – PARTE I: O “MILAGRE ECONÔMICO”
A principal peça propagandística da Ditadura Militar (alguns preferem Civil-Militar) brasileira foi o chamado “Milagre Econômico”, um breve período de crescimento econômico acelerado entre 1967 e 1973, com taxas próximas de 10% ao ano e até acima disso. Como veremos aqui, isto se deu graças a fatores externos e internos.
Externamente, a economia ocidental ia muito bem, sobretudo os 7 grandes, que dispunham de capital abundante para investir em países em desenvolvimento. Neste mesmo período, o comércio mundial cresceu 18% ao ano, estimulando as exportações.
Internamente, as causas foram mais sombrias. O arrocho salarial foi violentíssimo: em 1974 o salário-mínimo valia pouco mais da metade do valor que tinha quando foi criado em 1940. Isso levou a um aumento das horas trabalhadas, a uma subida significativa nos acidentes de trabalho e a uma população cada vez mais desnutrida, o que se refletiu em um aumento da mortalidade infantil. Os ricos ficaram mais ricos, a classe média melhorou de vida e a imensa maioria da população empobreceu ainda mais, em um país que já era extremamente desigual. A diferença de expectativa de vida entre a camada com menos renda e a com mais renda chegou aos 15 anos. Aumentou a concentração fundiária.
Para piorar, a Ditadura Militar deixou uma “herança maldita” também em termos econômicos. Depois da euforia do “Milagre Econômico”, a década de 1980 foi marcada pela crise econômica permanente, derivada do enorme endividamento ocorrido durante o regime autoritário. A dívida externa, que representava 2% do PIB à época de JK, mais do que dobra entre 1980 e 84 e alcança 46% do PIB. Isso levou a uma inflação descontrolada que logo se transformaria em hiper-inflação.
Eis os dados:
I. O “MILAGRE”
Variação do PIB (depressão) entre 1960-1965
Ano %
1960 9,40
1961 8,60
1962 6,60
1963 0,60
1964 3,40
1965 2,40
VERSUS
Variação do PIB (“milagre”) entre 1967-1973
1967 4,20
1968 9,80
1969 9,50
1970 10,40
1971 11,34
1972 11,94
1973 13,97
– Em 6 anos, de 1967-1973, o PIB cresce 88,4% e o PIB per capita 60,8%
II. OS SANTOS
Conjuntura econômica internacional favorável:
– De 1967-1973, o PIB dos 7 Grandes (EUA, Japão, Alemanha Ocidental, França, Canadá, Itália e Inglaterra) cresceu 31,3% (média de 4,6% ao ano – ritmo jamais igualado)
– No mesmo período, o comércio mundial cresceu a uma taxa de 18% ao ano
– O capital estrangeiro no Brasil em bilhões de US$:
1960 1,2
1970 3,2
1980 17,5
ARROCHO SALARIAL (1960=100%)
Ano %
1960 100,00
1961 111,52
1962 101,82
1963 89,51
1964 92,42
1965 89,19
1966 76,03
1967 71,92
1968 70,39
1969 67,74
1970 68,93
A década de 70 e o fundo do poço do arrocho salarial
“No ano de 1974* o salário mínimo chegou a seu nível mais baixo, representando em termos reais pouco mais da metade do valor estabelecido em 1940.” (ver quadro I)
* No ano anterior o PIB crescera praticamente 14% !
Quadro I – Índices de salários mínimos reais
Julho de 1940 = 100
Anos Índice de salário mínimo real
1969 68
1970 69
1971 66
1972 65
1973 59
1974 54
1975 57
1976 57
1977 59
1978 61
1979 61
Manipulação dos índices inflacionários:
– Em 1973 o governo Médici festejou uma taxa de inflação de 15,5%; o IPC, usado no cálculo dos reajustes salariais é de 14%, mas em 1977, um relatório do Banco Mundial revela um estudo (que tinha sido feito pelo próprio governo brasileiro) indicando um índice de 24,%
Concentração de renda entre 1960 e 1970
Quadro II
Distribuição de renda pessoal: 1960, 1970
_________________________________________________
Estrato da população Proporção da renda total (%)
Economicamente ativa
1960 1970
Baixa (50%) 17,73 14,91
Média baixa (30%) 27,92 22,85
Média alta (15%) 26,66 27,38
Alta (5%) 27,69 34,86
Total (100%) 100,00 100,00
Obs:
A renda que mais aumentou foi a da classe alta, 25,89%, i.e., mais de um quarto;
A renda que mais desceu foi a da classe média baixa: cai 18%;
Logo atrás vem a classe baixa, que perde 16% no período;
A classe média alta fica quase estacionada: aumenta apenas 2,7% no período
III. CONSEQUÊNCIAS DO “MILAGRE”
Extensão da jornada de trabalho
Força de trabalho Não-Agrícola: Classes de Horas Semanais de Trabalho
(% do total de pessoas ocupadas)
Número de horas de 1968 (2º trimestre) 1972 (4º trimestre)
Trabalho por semana SP RJ-GB SP RJ-GB
Até 14 horas 1,6% 1,3% 1,0% 0,9%
De 15 a 39 horas 14,8% 17,9% 11,3% 14,4%
De 40 a 49 horas 59,4% 57,6% 59,5% 52,9%
50 horas e mais 24,2% 23,2% 28,2% 31,8%
Total de ocupados 100% 100% 100% 100%
Fonte: SINGER,Paul.A crise do milagre. Rio de Janeiro:Paz e Terra,1977.p.81.
Desnutrição
Período Desnutridos % sobre população
1961-63 27 milhões 38%
1974-75 72 milhões 67%
1984 86 milhões 65%
* I.e., pessoas que consomem menos de 2.240 calorias diárias (p.299)
Fonte: SILVA,Opus cit.,p.300.
Mortalidade infantil em algumas capitais
Ano Recife Belo Horizonte São Paulo Goiânia
1950 230,4 103,8 89,7 117,5
1960 151,7 74,2 62,9 —
1964 125,6 — 67,7 87,0
1966 149,4 87,2 73,8 84,0
1968 153,9 102,3 75,1 46,6
1970 205,7 107,7 — 98,5
1971 193,7 102,2 — 122,2
Fonte: SINGER,Paul.A crise do milagre. Rio de Janeiro:Paz e Terra,1977.p.83.
Obs: Nesta época (MENDONÇA & FONTES,1994:28) o Estado destinava apenas 0,2% do PIB para a Saúde Pública
Acidentes de trabalho
Média de acidentes de trabalho registrados por dia útil (1971-1977)
Ano Média por dia útil
1970 4 405
1971 4 996
1972 5 370
1973 5 891
1974 6 355
1975 5 717
1976 5 294
Fonte: POSSAS, Cristina. Saúde e Trabalho: a crise na previdência social. Rio de Janeiro, Graal, 1981. p.132. citado por MENDONÇA & FONTES,História do Brasil Recente, 1964-1992,1994, p.68.
Concentração fundiária
Índice de Gini* 1920-1980
1920 0,804
1940 0,831
1950 0,843
1960 0,841
1970 0,843
1975 0,851
1980 0,859
O índice de Gini indica o grau de concentração fundiária:
Nula 0,000 – 0,100
Fraca 0,101 – 0,250
Média 0,251 – 0,500
Forte 0,501 – 0,700
Muito Forte 0,701 – 0,900
Absoluta 0,901 – 1,000
Quadro da esperança de vida em 1976
Esperança de vida ao nascer segundo faixa salarial – 1976
Menos de 1 salário mínimo 55,4 anos
Entre 1 e 2 salários mínimos 59,6 anos
Entre 2 e 5 salários mínimos 64,2 anos
Mais de 5 salários mínimos 69,8 anos
Conjunto 60,8 anos
Fonte: MENDONÇA & FONTES, opus cit., p.69
IV. A HERANÇA
O crescimento da dívida externa
Relação entre o volume da dívida externa e o PIB (1980-84):
1980 1981 1982 1983 1984
18,9 19,1 28,5 41,1 46,3
Fonte: SILVA,Opus cit.,p.299.
Taxas de inflação entre 1960-1983
Ano % Conjuntura
1960 30,0
1961 47,7
1962 51,3 ]
1963 81,3 |
1964 91,9 |
1965 34,5 | Ciclo depressivo da
1966 38,8 | economia brasileira
1967 24,3 |
1968 25,4 |
1969 20,2 ]
1970 19,2 ]
1971 19,8 | Período do “milagre” econômico
1972 15,5 |
1973 15,7 |
1974 34,5 ] * impacto dos preços do petróleo
1975 29,4
1976 46,3
1977 38,8
1978 40,8 * Grandes greves operárias em São Paulo
1979 77,2
1980 110,2
1981 95,2 ]
1982 99,7 | Exportação de capitais para pagamento da dívida externa
1983 211,0 ]
Fontes:
MENDONÇA & FONTES, História do Brasil Recente, 1964-1992,São Paulo: Ática,1994.
SILVA,Francisco Carlos Teixeira da Silva. “A modernização autoritária: do golpe militar à redemocratização (1964/1984)” In: LINHARES,Maria Yedda. História Geral do Brasil. Rio de Janeiro:Campus,1990.p.288.