/HISTÓRIAS DO SAMBA – 42. Palavra azul

HISTÓRIAS DO SAMBA – 42. Palavra azul

42. Palavra azul

O que é o samba, afinal? Nem adianta consultar os acadêmicos, envoltos em uma briga de foice que envolve a origem da palavra, provavelmente vinda de Angola e derivada do bantu semba, que significa umbigo ou oração. Outro já diz que o termo tem origem indígena e por aí vai. Quem sabe mesmo de samba são os sambistas, vamos a eles.

Sombrinha e Marquinhos PQD, sambistas de responsa, chamam o samba de “a arte mais pura”, “a nossa mistura”, “cultura que é bem popular” (Quem é de sambar). Noel, na época em que estava apaixonado pela Julinha, driblava o debate da origem do samba, para ele o samba “não vem do morro nem da cidade”, aquele que “suportar uma paixão”, “sentirá que o samba, então, nasce do coração”. Quanto ao significado do samba, Noel fez, para variar, versos inesquecíveis: “sambar é chorar de alegria, é sorrir de nostalgia, dentro da melodia” (Feitio de Oração).

Para o baiano Assis Valente, “Quem samba tem alegria” e a batucada foi inventada “Pra deixar de padecer, salve o prazer” (Alegria). Zé Keti, em uma época de afirmação das classes populares, cantou o samba como “A voz do morro”, que leva a alegria “para milhões de corações brasileiros” (A voz do morro). Paulinho da Viola, com a sensibilidade habitual, acha que o samba vem “quando bate uma saudade, triste, carregado de emoção”, “no reverso inevitável da paixão”, mas se “surge a luz da criação no pensamento” o compositor “trata com ternura o sofrimento e afasta a solidão” (Quando bate saudade).

Heitor dos Prazeres era mais concreto: “um pandeiro, uma mulata e um crioulo com passo de bamba” (Nada de rock, rock). Ataulfo Alves queria morrer “numa batucada de bamba, na cadência bonita do samba” (Na cadência do samba). Billy Blanco afirmava que o samba fazia da tristeza “um carnaval de beleza que outras terras não têm” (Viva Meu Samba). Manoel Santana, se pudesse, “viveria para o samba eternamente”, “pois o samba é alegria, que conquista toda a gente”; aproveita para pedir perdão a Deus, afirmando que “só o samba é culpado de eu abandonar meu lar” (Se é pecado sambar).

Wilson das Neves também não faz por menos: “é o meu axé, meu som sagrado, onde dou meu recado, nos versos meus, antes do adeus” e “se um samba houver”, para ele “não falta mais ninguém” (Som sagrado). Teresa Cristina, Hermínio Belo de Carvalho e Luciane Menezes também pegam pesado: “o samba é uma grande escola, de arte, amor e beleza”, “o samba, enfim, é a própria nobreza”. Se o samba veio da Bahia, apelemos para estes dois baianos geniais, Caetano e Gil, que parecem sintetizar tudo: “o samba é pai do prazer, o samba é filho da dor, o grande poder transformador”.

Mas a palavra final vai ser de Seu Azul (Diomário Marinho), membro da Velha Guarda da Portela: “O samba, ele é um lamento negro. E na língua africana era semba. O nome é semba, na língua africana, nas nações africanas, e o samba é um lamento negro. É um lamento de sofrimento. O samba nasceu na senzala. É que nem aquele samba do Candeia. O samba nasceu na senzala.”